sábado, 24 de abril de 2010

Resumo 13 – Personalidade Jurídica do Estado

II – Do Estado (continuação)

4. Personalidade jurídica do Estado.


“À multidão assim unida numa só pessoa se chama Estado, em latim civitas. É esta a geração daquele grande Leviatã, ou melhor (para falar em termos mais reverentes), daquele Deus Mortal, ao qual devemos, abaixo do Deus Imortal, nossa paz e defesa” (Thomas Hobbes)


Pessoa. A palavra pessoa vem do latim persona, máscara utilizada pelos atores do teatro romano, a qual servia para caracterizar os personagens e, ao mesmo tempo, dar maior ressonância à voz (per sonare: soar por, através de). Pessoa, na linguagem atual, é a dimensão social do ser humano, daí derivando a personalidade.

Personalidade jurídica. Para o Direito, pessoa é o sujeito ou titular de direitos e obrigações. A personalidade jurídica é a capacidade genérica, ou em abstrato, de ser sujeito de direitos e obrigações. Todos os seres humanos são pessoas? Coisas e animais são pessoas? O Estado é uma pessoa?

Seres Humanos. Atualmente, todos os seres humanos são considerados pessoas perante o Direito, ou seja, capazes de direitos e obrigações. Nem sempre foi assim: na antiguidade greco-romana, só os cidadãos eram pessoas, o que excluía mulheres, crianças, escravos e estrangeiros. Onde há escravidão os escravos não são considerados pessoas. Quanto aos fetos, discute-se se são ou não pessoas.

Coisas e animais. Na Idade Média chegou-se a processar objetos e animais, como vassouras e gatos, como supostos cúmplices de bruxaria, o que, na linguagem atual, lhes conferia personalidade. Atualmente, discute-se se a proteção aos animais e às plantas decorre de direitos próprios destes (Herman Benjamin) ou de um imperativo ético (Miguel Reale).

O caso Harry Berger. O alemão Harry Berger era um agente do Comintern que veio ao Brasil para participar da tentativa de revolução comunista em 1935. Preso, foi barbaramente torturado pela polícia de Getúlio Vargas. Heráclito Sobral Pinto, então um jovem advogado, à falta de uma lei que pudesse proteger o preso, já que o habeas corpus estava suspenso, utilizou, em seu favor, a lei de proteção aos animais, assinada anos antes pelo próprio Vargas.

Pessoa Jurídica. O Direito reconhece a personalidade jurídica de entidades formadas por outras pessoas, dotadas de existência e vontade próprias, que não se confundem com seus membros, como empresas, clubes, associações e o Estado. O Estado, portanto, é uma pessoa jurídica, pois é formado por outras pessoas e é capaz de direitos e obrigações.

Histórico. Deve-se ao contratualismo a primeira concepção do Estado como um ente autônomo, com vontade própria, diferenciado de seus membros. Essa concepção, porém, era puramente política. As teorias para qualificar juridicamente o Estado surgem no século XIX, com publicistas alemães como Savigny, Gierke e Jellinek. Deve-se a eles a qualificação do Estado como pessoa jurídica, com importantes repercussões no Direito Público.

Teorias. A partir do século XIX, surgiram várias teorias para explicar a personalidade jurídica do Estado:

ficcionismo: para essa teoria, pessoas, na realidade, são apenas os seres humanos dotados de consciência e vontade. Segundo Savigny, a pessoa jurídica é uma ficção criada pelo Direito por motivos de ordem prática (ficcio juris), a fim de possibilitar que certas entidades sejam sujeitos de direitos e obrigações legais.
realismo: para os realistas, o Estado tem existência real, alguns chegando ao exagero de afirmar que essa realidade é material (organicismo biológico). Já os adeptos do organicismo ético como Gierke, quando as pessoas se reúnem para realizar uma finalidade, surge um novo ente real, com vida própria e independente de seus membros, mas que não tem existência material, e sim moral (espiritual, ideal).
institucionalismo: para Hauriou, a pessoa jurídica ou instituição é uma unidade de fim. Segundo a filosofia tomista, existem unidades físicas (ex.: um bloco de metal) e unidades de fim (partes que se unem para um objetivo comum, como um relógio). Não só os objetos materiais são reais, mas também as emoções e as idéias. A instituição é uma união de pessoas em torno de uma idéia e, assim, tem existência real.

Teoria de Jellinek. Para Jellinek, sujeito, em sentido jurídico, não é uma algo material, palpável, mas simplesmente uma capacidade, criada mediante a vontade da ordem jurídica. A ordem jurídica pode atribuir essa capacidade a seres humanos e a instituições. Assim, a personalidade jurídica do Estado é algo real, e não fictício.

Oposição. Em oposição à idéia de Estado como pessoa jurídica, Seydel afirma que o Estado é apenas terra e gente dominadas por uma vontade superior. Para o anarquista de cátedra Duguit, o Estado é uma relação de fato e, portanto, não poderia se transformar em pessoa.

Importância. O reconhecimento da personalidade jurídica do Estado foi uma conquista importantíssima do Direito Público. Dela resulta: a capacidade do Estado para ser sujeito de direitos e obrigações; sua vontade não se confunde com a dos governantes (órgãos); limitação do poder; conciliação do jurídico com o político (vontade + regulação).

Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo III, itens 60 a 63.
Leituras complementares: Miguel Reale, Lições preliminares de Direito, Cap. XVIII. Georg Jellinek, Teoría General del Estado, L II, Cap. 6.

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