sábado, 28 de agosto de 2010

Resumo 23 - Sistemas Eleitorais

IV – Estado e Governo
Regimes de Governo – Democracia – continuação

Sistemas Eleitorais



“A vontade do povo significa, na prática, a vontade do maior número ou da parte mais ativa do povo, da maioria ou daqueles que conseguem se fazer aceitos como a maioria; conseqüentemente, o povo pode desejar oprimir uma parte de seu número, e são necessárias tantas precauções contra isto como contra qualquer outro abuso do poder” (J. Stuart Mill, Sobre a Liberdade, 1859)


Introdução. Na democracia representativa a escolha de representantes é feita pelo sufrágio (voto). Há diversas formas de se organizar a escolha dos candidatos e contabilizar os votos, a fim de que a representação seja autêntica, ou seja, corresponda o mais fielmente possível à vontade popular, pois esse é o principal objetivo da democracia. Isso é feito por meio dos sistemas eleitorais.

Definição. Sistema eleitoral é o “conjunto de regras que define como, em uma determinada eleição, o eleitor pode fazer suas escolhas e como os votos são contabilizados para serem transformados em mandatos”. Em outras palavras, o sistema eleitoral determina “como se transformam votos em poder” (Jairo Nicolau)

Tipos de sistemas. Há diversos tipos de sistemas eleitorais, que podem ser utilizados de forma exclusiva ou, como é mais comum, de forma combinada. Os sistemas mais conhecidos são o Majoritário, o Distrital, o Proporcional e o Distrital Misto.

Sistema Majoritário. É o sistema mais simples: quem obtém mais votos é eleito. Pode exigir maioria simples (maior número de votos entre os candidatos) ou maioria absoluta (mais da metade dos votos válidos, que pode ser obtida em primeiro ou segundo turno de votação). Utilizado para a eleição do chefe do Executivo (presidente, governador e refeito), para senador e, no sistema distrital, para a escolha de candidatos ao Legislativo.

Conseqüências do Sistema Majoritário. O sistema de maioria simples tende ao bipartidarismo e forma governos mais homogêneos, com maioria mais clara e programa mais definido. Os partidos pequenos tendem a enfraquecer, porque não têm força para lançar candidatos próprios. O sistema de maioria absoluta (turno duplo, se necessário) favorece o pluripartidarismo e forma governos de coalizão, pois os partidos preferem lançar candidatos próprios no primeiro turno e deixar as coalizões para o segundo.

Sistema Distrital. Utilizado para a eleição dos membros do Poder Legislativo (órgãos colegiados). Divide-se a circunscrição (cidade, estado ou País) em distritos, em número correspondente ao de cadeiras na casa legislativa. Em cada distrito realiza-se uma eleição pelo sistema majoritário. Normalmente, cada distrito elege apenas um representante. Ex: Inglaterra e EUA.

Conseqüências do Sistema Distrital. As mesmas do sistema majoritário. Aspectos positivos: aproximação entre o eleitor e o representante e barateamento das campanhas. Aspectos negativos: facilitação do clientelismo, possibilidade de formação de “currais eleitorais”, sub-representação das minorias e possibilidade de manipulação do desenho dos distritos (gerrymandering)

Sistema Proporcional. Criado na Bélgica, em 1900, sob a inspiração de Stuart Mill. Possibilita a representação de minorias e correntes de opinião diversas no Poder Legislativo. A eleição é feita em toda a circunscrição e não por distritos. Basicamente, cada partido elege, para o Legislativo, número de representantes proporcional votação obtida. Ex.: 20% dos votos = 20% das cadeiras.

Cálculo da representação proporcional. Divide-se o número de votos válidos pelo número de cadeiras a preencher = quociente eleitoral (QE); divide-se a votação do partido (ou coligação) pelo quociente eleitoral (QE) = quociente partidário (QP). QP será número de cadeiras a que o partido (ou coligação) tem direito. Se houver sobras, as vagas restantes são preenchidas pelo sistema da maior média (repete-se a operação, adicionado-se 1 ao QE).

Exemplo. Numa cidade com 100.000 votos válidos e 20 vagas para vereador, o QE é 5.000 (são precisos 5.000 votos para o partido conquistar uma cadeira na Câmara de Vereadores). O partido A obteve 20.000 votos, o Partido B teve 10.000 votos e o Partido C teve 4.000 votos, a quantas cadeiras terá direito cada partido? Resposta: se o Partido A obteve 20.000 votos, seu QP é 4: terá direito a 4 cadeiras. Se o Partido B teve 10.000 votos, seu QP é 2: terá direito a 2 cadeiras. Se o Partido C teve 4.000 votos, não terá direito a cadeira, pois não atingiu o QE.

Preenchimento das vagas no sistema proporcional. Pelo sistema de lista aberta (usado no Brasil), as vagas de cada partido são preenchidas pelos candidatos mais votados, por ordem de votação. Pelo sistema de lista fechada, o partido apresenta previamente uma lista, com a ordem de preferência dos candidatos, preenchendo as vagas conquistadas segundo essa ordem.

Conseqüências do Sistema Proporcional. O sistema proporcional possibilita a representação das minorias, que têm poucas chances pelo sistema majoritário, favorecendo o pluralismo político. Isso gera o pluripartidarismo, às vezes com multiplicação excessiva de partidos, o que tem levado ao estabelecimento de cláusulas de barreira (requisitos mínimos para que um partido possa eleger representantes). Os candidatos de um partido com grande votação ou com um “puxador de votos” (ex. Enéias) podem ser eleitos com um número de votos menor do que candidatos mais votados de outros partidos.

Sistema Distrital Misto. Utilizado para as eleições no Poder Legislativo (menos o Senado). Metade dos representantes é eleita pelo sistema distrital e metade pelo sistema proporcional. O eleitor dá dois votos: um no seu distrito e outro na circunscrição. Utilizado na Alemanha e proposto para o Brasil. Seus defensores alegam que ele une as vantagens do sistema distrital e do proporcional.

Sistemas adotados no Brasil. Chefia do Executivo (Presidente da República, Governador de Estado e Prefeito): majoritário (maioria absoluta, turno duplo se necessário). Maioria simples para municípios com menos de 200 mil eleitores. Senado: majoritário: maioria simples. Legislativos (Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas dos Estados e Câmara de Vereadores): proporcional com lista aberta. Há proposta para uma reforma do sistema eleitoral brasileiro, para a adoção do sistema Distrital Misto, com lista fechada.

Bibliografia
Leitura essencial
: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, 101 a 103.
Leituras complementares: Paulo Bonavides, Ciência Política, Cap. 17. Jairo Nicolau, Sistemas eleitorais, ed. FGV. José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional positivo, Título V, Cap. II, n. 18.

Resumo 22 - Sufrágio

IV – Estado e Governo

Regimes de Governo – Democracia – continuação

O Sufrágio


“Nenhum homem é bom o bastante para governar a outro sem o seu consentimento" (Abraham Lincoln)

Introdução. Diversas são as formas de escolha de governantes: força física, sorteio, sucessão hereditária, voto etc. A democracia representativa, que prevalece no Estado Moderno, requer a escolha de representantes para governar em nome do povo. Essa escolha é feita através do sufrágio, que envolve o direito de votar e ser votado.

Definição. Sufrágio é o direito público subjetivo (exercido na esfera pública e para fins públicos) de participar das decisões políticas, votando (sufrágio ativo) ou sendo votado (sufrágio passivo). Observe-se que o sufrágio é utilizado tanto para a escolha de representantes (democracia representativa) como para a expressão direta da vontade popular (democracia semidireta: plebiscito e referendo).

Natureza. O sufrágio é um direito ou obrigação? Na democracia, o sufrágio é fundamentalmente um direito público subjetivo.

Voto obrigatório. Há quem entenda que, devido à necessidade de se escolher representantes e de se saber qual é a vontade do povo, o sufrágio ativo (voto) é também uma função do cidadão, e, portanto, um dever, da mesma forma que serviço militar e o tribunal do júri, o que justificaria a sua obrigatoriedade.

Extensão. Segundo a extensão, o sufrágio pode ser restrito ou universal, conforme sejam ou não previstas restrições ao seu exercício. O sufrágio universal é o único compatível com a atual idéia de democracia. Ele não significa ausência total de restrições, mas sim ausência de restrições discriminatórias ou injustificáveis.

Restrições ao sufrágio. São consideradas justificáveis e, portanto, compatíveis com o sufrágio universal, desde que razoáveis, as restrições ligadas a: nacionalidade, idade, condição mental, condenação judicial (a questão da “ficha suja”), engajamento militar etc. São consideradas incompatíveis com o sufrágio universal as restrições de cunho: racial (judeus na Alemanha nazista, negros no sul dos EUA até a década de 60), sexo (o sufrágio feminino), condição econômica (sufrágio censitário), condição intelectual (sufrágio capacitário, o voto do analfabeto) etc.

Modo de exercício. O sufrágio ativo (voto) pode ser: aberto ou secreto, conforme deva ser exercido com publicidade ou em segredo; múltiplo ou igual, conforme valha mais para alguns ou tenha valor igual para todos; direto ou indireto, conforme tenha por destinatário o próprio candidato ao mandato ou um colégio eleitoral que vai escolher o mandatário.

O sufrágio no Brasil. Império e República Velha: voto censitário, coronelismo, voto de cabresto, curral eleitoral, fraudes etc. A Revolução de 30: título eleitoral, cédula oficial, voto secreto. A urna eletrônica. Atualmente, temos no Brasil o sufrágio secreto, com valor igual, direto e com reduzidas possibilidades de fraude.

As fraudes na Flórida. No capítulo 1 do livro Stupid white men, Michael Moore relata as fraudes ocorridas na eleição presidencial na Flórida em 2000. Foram impostas restrições arbitrárias ao sufrágio e criadas dificuldades para o voto que impediram milhares de eleitores pobres, negros e latinos de votar. Tais fraudes foram decisivas para a eleição de George W. Bush, que mesmo assim teve menos votos populares que Al Gore.

Bibliografia
Leitura essencial
: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 97 a 100.
Leitura complementar: Paulo Bonavides, Ciência Política, Cap. 16. Jairo Nicolau, História do voto no Brasil. Michael Moore, Stupid white men, Cap. 1.
Filme: Mississipi em Chamas (Mississipi Burning )

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Resumo 21 - Partidos Políticos

IV – Estado e Governo

1. Regimes de Governo

a) Democracia – continuação

Representação Política – Partidos Políticos


“Sem os partidos políticos não poderia funcionar o governo representativo, nem a ordem despontar do caos eleitoral” (James Bryce)

“O melhor partido é apenas uma espécie de conspiração contra o resto do país” (Lord Halifax)

Introdução. Os partidos políticos surgiram na democracia moderna, servindo como intermediários entre as diversas correntes de opinião da sociedade e o Estado e canalizando essas correntes para a representação política. Embora em declínio, eles ainda são os atores principais do sistema político, sendo a democracia representativa também chamada de “democracia de partidos”.

Histórico. É natural, na sociedade humana, a tendência à formação de grupos políticos rivais, como os democratas e oligarcas em Atenas, os defensores da plebe e do Senado em Roma, os guelfos (partidários do papa) e gibelinos (partidários do imperador) na Idade Média etc. Essa rivalidade freqüentemente extrapolava a arena política e degenerava em violência e guerra civil.

Combate às facções. Tradicionalmente, esses grupos rivais eram chamados de facções e considerados nocivos por dividirem a sociedade. Rousseau e os líderes da Revolução Francesa combateram as “sociedades parciais”, não admitindo a existência de “corpos intermediários” entre povo e a “vontade geral”. Em 1791 foi aprovada a Lei Le Chapelier, que proibia qualquer tipo de associação na França.

Aceitação dos partidos. Na Inglaterra, onde era tradicional a divisão dos grupos políticos entre tories (proprietários rurais, conservadores, apoiadores da Monarquia) e whigs (burgueses, liberais, apoiadores do Parlamento), os partidos começaram a ser aceitos no final do século XVIII, a partir dos escritos de Burke e da compreensão do papel da oposição.

Ascensão dos partidos. No século XIX, com a massificação da política provocada pela extensão do sufrágio, os partidos foram assumindo lugar de destaque no sistema político, congregando as diferentes correntes de opinião da sociedade e servindo de intermediários entre a massa desorganizada de eleitores e o governo do Estado. Com isso, eles passaram a ser regulados pelo sistema jurídico, integrando até mesmo a Constituição de alguns Estados, como o Brasil.

Declínio dos partidos. Nas últimas décadas, os partidos têm sofrido um declínio em sua importância, pois não têm se mostrado eficientes para canalizar as reivindicações da sociedade contemporânea, sendo muitas vezes substituídos nessa tarefa por outros tipos de organização social, como as ONGs. Para isso contribui a sua estrutura interna pouco democrática e o fato de se dedicarem exclusivamente ao jogo político e aos interesses de seus membros, deixando de constituir um canal de comunicação para a sociedade.

Crítica aos partidos. Segundo o teórico Robert Michels (1876-1936), todos os partidos políticos têm a tendência à formação de oligarquias internas, que passam a comandá-los segundo seus interesses pessoais. Embora sejam considerados essenciais à democracia, a estrutura interna dos partidos raramente é democrática.

Natureza. Para alguns teóricos, o partido político é uma realidade sociológica, já para outros, como Kelsen, é um órgão do Estado. Em alguns Estados, como a Alemanha, ele é considerado como pessoa jurídica de direito público; já em outros, como o Brasil, é considerado como pessoa jurídica de direito privado.

Conceito. “Organização de pessoas que, inspiradas por idéias ou movidas por interesses, buscam tomar o poder, normalmente por meios legais, e nele conservar-se para a realização dos fins propugnados” (Paulo Bonavides)


Classificações. Há várias classificações relativas aos partidos políticos, segundo autores como Max Weber, Giovanni Sartori, Angelo Panebianco, Norberto Bobbio e Maurice Duverger. Utilizaremos como base a deste último, com algumas contribuições dos outros.

Quanto à organização interna. Quanto à organização interna, ou seja, com relação ao seu funcionamento e o tipo de filiados que o compõem, Duverger classifica os partidos em:
partidos de quadros: mais preocupados com a qualidade do que com a quantidade de membros e são financiados por grandes contribuintes, não necessariamente filiados (ex.: partidos Republicano e Democrata nos EUA e o PSDB no Brasil)
partidos de massas: nascem para representar as massas trabalhadoras, buscam o maior número possível de adeptos e são financiados por contribuições dos filiados (ex.: o Partido Trabalhista inglês e o PT no Brasil)

Partido “pega-tudo”. Segundo a doutrina mais atual, essa classificação está superada, pois, com a profissionalização da classe política e a oligarquização dos partidos, tanto os partidos de quadros como os de massas tendem a se transformar no que se chamou de partidos eleitorais de massa ou partidos “pega-tudo”, flexibilizando seus programas e dirigindo-se mais aos eleitores em geral do que aos seus filiados ou a uma classe social específica.


Quanto à organização externa. Essa classificação diz respeito ao número de partidos que existem ou podem existir num Estado:
Partido único: sistema próprio do totalitarismo, que só admite um partido e não admite divisões políticas. Ex.: nazi-fascismo, URSS e Cuba.
Bipartidarismo: sistema em que dois grandes partidos predominam em razão do sistema eleitoral, sem proibir a existência de outros. Ex.: Inglaterra e EUA.
Pluripartidarismo: sistema em que mais de dois partidos predominam e têm chances de chegar ao poder, podendo levar à extrema dispersão e à necessidade de imposição de limites, que são as “cláusulas de barreira”. Ex.: Brasil e Alemanha.

Quanto ao âmbito de atuação. Segundo essa classificação os partidos são:
Partidos de vocação universal ou internacional: extrapolam os limites dos Estados. Ex.: o antigo PC da URSS.
Partidos nacionais: atuam nos limites do território do Estado, sem se restringir a uma região. É o único tipo permitido atualmente no Brasil.
Partidos regionais: atuam em determinadas regiões de um Estado. Ex.: os partidos estaduais da República Velha.
Partidos locais: atuam apenas nas cidades. Não existem exemplos dignos de nota.

Quanto à ideologia. Essa classificação é baseada em Norberto Bobbio, que em obra recente defende a validade, ainda hoje, da dicotomia entre direita e esquerda, que para alguns estaria superada. Essa divisão tem origem na Revolução Francesa, quando a Assembléia Nacional dividiu-se entre os jacobinos (radicais, defensores da igualdade, que se sentavam à esquerda do salão) e girondinos (moderados, defensores da liberdade e que se localizavam à direita). Para Bobbio, o critério de distinção entre os dois pólos é a postura diante da igualdade.

Esquerda. Preocupação com a igualdade real. Reivindica justiça social por meio de maior intervenção do Estado. Prega a predominância do coletivo, mesmo que isso prejudique a liberdade individual. A centro-esquerda (social-democracia) atua segundo as regras do jogo democrático. A extrema-esquerda despreza a democracia liberal e aceita métodos violentos e governo totalitário para atingir suas finalidades (Ex.: URSS, Cuba, FARCs, MST).

Direita. Valoriza a liberdade individual e a igualdade formal (perante a lei). Condena a intervenção do Estado na economia e na sociedade. As desigualdades sociais seriam naturais e o progresso do indivíduo deve depender do próprio esforço. A centro-direita (direita liberal) aceita as regras do jogo democrático. A extrema-direita despreza a democracia e prega superioridade de um grupo sobre outros (nacionalismo xenófobo, racismo etc.), usando milícias e métodos violentos para a imposição da ideologia (Ex.: nazi-fascismo, Ku Klux Klan).

Partidos políticos no Brasil. Os partidos políticos surgiram no Brasil durante o reinado de D. Pedro II, dividindo-se entre conservadores e liberais. Durante a República Velha predominaram os partidos de âmbito estadual (PRP etc.). Entre 1946 e 1965, predominaram o PSD (centro), PTB (centro-esquerda) e a UDN (centro-direita). Durante a ditadura militar, só foram permitidos dois partidos, a ARENA (apoio à ditadura) e o MDB (oposição consentida). Com a redemocratização, surgiram: PDS (ex-arena, atual PP), PMDB (ex-MDB) e outros. Atualmente, temos DEM (ex-PFL, dissidência do antigo PDS), PT (intelectuais de esquerda e sindicalistas), PSDB (dissidência do PMDB), PDT (herdeiro do PTB getulista), PPS (ex-PCB), PC do B (dissidência do antigo PCB), PSOL (dissidência do PT), PV etc.

Outras formas de representação (profissional, corporativa, institucional).

Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 84 a 87.
Leituras complementares: Paulo Bonavides, Ciência Política, Caps. 19 (item 5), 23, 24 e 25. Maurice Duverger, Os partidos políticos (ed. UNB). Norberto Bobbio, Direita e Esquerda. Reinaldo Dias, Ciência Política. Rogério Schimitt, Partidos políticos no Brasil.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Dois artigos de Marco Antonio Villa

Publico abaixo dois artigos do professor Marco Antonio Villa, com excelentes análises do atual quadro político brasileiro, especialmente da tendência personalista e messiânica do nosso atual presidente e da incompetência da oposição em cumprir o seu papel.

O nosso 18 Brumário

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Lula quer aparecer como benfeitor de todas as classes, tal qual Luís Bonaparte
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O MAIOR PERSONAGEM da eleição não é candidato: Luiz Inácio Lula da Silva. Hoje é o grande cabo eleitoral não só da sua candidata mas de toda base governamental. Chegou a esta condição contando com o auxílio inestimável da oposição.
No primeiro mandato teve sérios problemas, como na crise do mensalão. A oposição avaliou -erroneamente- que seria menos traumático e mais fácil deixá-lo nas cordas, para nocauteá-lo em 2006.
As saídas de José Dirceu, Antonio Palocci e Luiz Gushiken deram a Lula o protagonismo exclusivo. Só então teve condições de governar como sempre desejou.
A troika limitava sua ação e dividia as atenções políticas. Dava a impressão de que o chefe de Estado não era o chefe do governo.
A crise foi providencial para Lula: libertou-se do aparelho partidário, estabeleceu alianças como desejava e passou a ser a âncora exclusiva de sustentação do governo.
O segundo mandato, na prática, começou no início de 2006. A oposição mais uma vez evitou o confronto direto. Avaliou -erroneamente, novamente- que seria melhor manter os governos estaduais de São Paulo e Minas, transferindo o enfrentamento direto com Lula para 2010.
Em um terreno livre, Lula teve condições únicas para um presidente nos últimos 40 anos: estabilidade política, crescimento econômico e controle do Congresso.
As CPIs, que criaram problemas no primeiro mandato, perderam importância. Os frutos da estabilidade e uma conjuntura internacional favorável possibilitaram um rápido crescimento da economia e a expansão do consumo.
Paulatinamente, Lula foi afrouxando a política fiscal, abandonou as rígidas metas do primeiro mandato, manteve um câmbio artificial, incentivou o capital especulativo e foi empurrando para o próximo presidente uma bomba de efeito retardado.
Abrindo um imenso saco de bondades, ampliou o crédito para as classes C e D, favoreceu as viagens internacionais para a classe média e criou uma nova burguesia -a burguesia lulista- que ampliou o seu poder graças às benesses dos bancos oficiais. Expandiu numa escala nunca vista os programas assistenciais, como o Bolsa Família, e manietou os velhos movimentos sociais comprando suas lideranças.
Tal qual Luís Bonaparte, Lula "gostaria de aparecer como o benfeitor patriarcal de todas as classes". Foi ajudado pela oposição, sempre temerosa de enfrentar o governo. Usando uma imagem euclidiana, Lula "subiu, sem se elevar -porque se lhe operara em torno uma depressão profunda". Ele almeja transformar o 3 de outubro no seu 18 Brumário.

Onde está a oposição?

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Lula lançou a pecha da herança maldita e não houve resposta; estavam assustados
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A OPOSIÇÃO perdeu a batalha ideológica. E não é de hoje. Quando Lula assumiu o governo, rapidamente construiu um discurso negador do passado -sua especialidade. Com uma diferença: agora estava na Presidência e com muito mais poder para impor a sua versão da história.
Lançando a pecha de que teria encontrado uma herança maldita, não recebeu uma resposta eficaz e convincente dos oposicionistas. Estes estavam assustados e desestimulados. Ser oposição é tudo o que não queriam ser.
Como disse Nícia, na comédia "A Mandrágora", de Maquiavel: "Para os que não têm poder, não existe nem mesmo um cachorro que lhes ladre na cara".
Sem combatividade, estavam prontos para aderir ao governo. Só não o fizeram porque surgiram escândalos envolvendo altas autoridades governamentais, devido às divergências regionais e por uma razão simples: não foram cooptados para fazer parte do governo.
Se os militares golpistas latino-americanos não resistiam a um "cañonazo" de milhares de dólares, os políticos brasileiros não resistem ao "Diário Oficial" e suas nomeações. Apesar da derrota de 2006, a oposição manteve o comportamento light. Nada de críticas. Era necessário pensar na governabilidade. O tempo foi passando e a eleição foi se aproximando.
A cada omissão, mais o discurso oficial se transformava em verdade absoluta, sobre o passado e o presente. Excetuando a batalha contra a prorrogação da CPMF, quando a oposição foi oposição e venceu, nos últimos quatro anos a eficiência governista foi exemplar.
A oposição poderia ter criticado o rumo da economia, a segurança pública, os milhões de analfabetos ou a péssima situação da saúde.
Mas silenciou. Abdicou do combate. Acreditou que o relativo crescimento da economia blindava o governo de críticas. Ledo engano.
No quinquênio juscelinista, o país cresceu a taxas superiores às atuais, realizou grandes obras (o que não ocorre agora) e JK não elegeu o sucessor. Por quê? Porque a oposição fez o seu papel, como em qualquer democracia que se preze. Com a proximidade das eleições, a oposição ficou sem saber o que fazer. Esqueceu uma lição básica (e óbvia): é preciso fazer política. Ao menos enquanto há tempo. A recusa ao debate pode abrir caminho para o autoritarismo.
Afinal, o filho de um oligarca calou o "Estadão", proibindo noticiar suas negociatas; enquanto um partido ocupou ao seu bel prazer as páginas de "Veja". E tudo com a chancela da "justiça". Deste jeito logo começaremos a achar que o México, sob domínio do PRI, era uma democracia.

MARCO ANTONIO VILLA é professor do Departamento de Ciências Sociais da UFSCar

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Resumo 20 - Democracia direta, semidireta e representativa

IV – Estado e Governo

1. Regimes de Governo

a) Democracia – continuação

Democracia direta, semidireta e representativa


“É nula toda lei que o povo diretamente não ratificar e, em absoluto, não é lei. O povo inglês pensa ser livre e muito se engana, pois o é somente durante a eleição dos membros do parlamento; logo que estes são eleitos, ele é escravo, não é nada. Durante os breves momentos de sua liberdade, o uso que dela faz, mostra que bem merece perdê-la.” (Rousseau, Do contrato social, 1765)

“O povo é admirável para escolher aqueles a quem deve confiar parte de sua autoridade (...) Mas saberá ele conduzir um assunto, conhecer os lugares, ocasiões e momentos mais favoráveis para resolvê-lo? Não: não saberá.” (Montesquieu, O espírito das leis, 1748)


Formas de Democracia. Conforme o grau de participação popular nas decisões mais relevantes do governo de um Estado, podemos classificar as formas de democracia como direta, semidireta e representativa. Essas formas de democracia podem ser praticadas isolada ou cumulativamente num Estado. No Brasil, por exemplo, predomina a democracia representativa, combinada com instrumentos de democracia semidireta, que são raramente utilizados.

Democracia direta. Era a forma de democracia praticada na Grécia antiga, especialmente em Atenas, onde o povo debatia e decidia as questões mais importantes da polis em assembléias realizadas em praça pública. Hoje esse tipo de democracia só é praticado em pequenos cantões (estados federados) suíços (Landsgemeinde) e ainda assim de forma restrita, porque os assuntos não são amplamente discutidos, havendo uma preparação prévia pelas autoridades.

Democracia semidireta. Nesse tipo de democracia o povo participa diretamente, propondo, aprovando ou autorizando a elaboração de uma lei ou a tomada de uma decisão relevante pelo Estado. A atuação do povo não é exclusiva, pois age em conjunto com os representantes eleitos, que vão discutir, elaborar ou aprovar a lei. É utilizada atualmente em combinação com a democracia representativa, que ainda prevalece. Muito usada nos EUA, é rara no Brasil.

Instrumentos da democracia semidireta. São instrumentos da democracia semidireta:
Plebiscito
• Referendo
• iniciativa popular
• veto popular
• recall


Plebiscito. Plebiscito (do latim plebiscitum: decreto da plebe) é uma consulta ao povo pelo qual este aprova ou não a elaboração de uma lei, uma emenda constitucional ou uma decisão governamental. Se houver aprovação, cabe ao poder competente a elaboração da medida. É importante notar que ele é anterior à lei ou à decisão governamental, que só serão elaboradas se houver aprovação popular. Ex: o plebiscito de 1993 sobre forma e sistema de governo.

Referendo. Referendo (do latim referendum: aprovação) é uma consulta feita ao povo sobre uma lei, emenda constitucional ou decisão governamental já elaborada pelo poder competente, mas ainda não vigente. Se houver aprovação, a medida entra em vigor. Note-se que o referendo é posterior à elaboração da medida. Ex.: o referendo de 2005 sobre o desarmamento.

Iniciativa popular. Na democracia representativa, o processo de elaboração de uma lei é iniciado por um projeto apresentado por um representante (membro do Poder Legislativo, chefe do Poder Executivo e, excepcionalmente, do Judiciário). A iniciativa popular é um instrumento de democracia semidireta pelo qual o processo legislativo pode ser iniciado por parte do povo, cabendo ao Poder Legislativo discutir e aprovar, ou não, o projeto. Exige-se que um número relevante de eleitores (1% do eleitorado, no Brasil) assine o projeto. Ex.: a Lei da Ficha Limpa, vigente nestas eleições.

Veto Popular. É um instrumento da democracia semidireta por meio do qual o povo pode vetar uma lei já aprovada ou revogar uma decisão judicial. Não existe no Brasil, sendo utilizado em alguns estados norte-americanos.

Recall. O recall é a revogação do mandato político pelo povo. Colhendo-se um número de assinaturas determinado pela Constituição ou pela lei, convoca-se um recall, através do qual o eleitorado decide se um mandatário deve ou não ter o seu mandato cassado. Também não existe no Brasil, sendo utilizado em alguns estados norte-americanos. Ex.: na Califórnia, em 2003, o povo revogou o mandato do governador Gray Davis e elegeu Arnold Schwarzenegger.

Deturpação da democracia semidireta. Embora sejam uma forma de aumentar a participação do povo em decisões importantes de governo, os instrumentos da democracia semidireta podem ser utilizados para legitimar medidas antidemocráticas, o que se faz mediante a manipulação da opinião pública com propaganda maciça e a intimidação da oposição, da imprensa e dos eleitores. É a clássica utilização de instrumentos da democracia para destruir a democracia. Exemplos: cesarismo, bonapartismo, nazismo e chavismo.

Democracia Representativa. Devido à impossibilidade da reunião de grande número de pessoas para a tomada de decisões e à desconfiança com relação à capacidade do povo de tomar decisões (v. Montesquieu), a democracia no Estado Moderno é predominantemente representativa, ou seja, o povo elege representantes para tomar as decisões em seu lugar.

“O único governo que pode satisfazer plenamente todas as exigências do Estado social é aquele no qual todo o povo participa; que toda a participação, mesmo na menor das funções públicas, é útil; que a participação deverá ser, em toda parte, tão ampla quanto o permitir o grau geral de desenvolvimento da comunidade; e que não se pode, em última instância, aspirar por nada menor do que a admissão de todos a uma parte do poder soberano do Estado. Mas como, nas comunidades que excedem as proporções de um pequeno vilarejo, é impossível a participação pessoal de todos, a não ser uma parcela muito pequena dos negócios públicos, o tipo ideal de um governo perfeito só pode ser o representativo.” (John Stuart Mill – 1806-1873)


Representação Política. O mandato é o instrumento da representação política. O mandato político foi inspirado no contrato de mandato do Direito Civil, através do qual uma pessoa nomeia outra para representá-la num ato jurídico.

Mandato imperativo. De início, o mandato político era imperativo, ou seja, havia vinculação do representante às instruções dos representados, que poderiam revogar o mandato caso houvesse desobediência ou infidelidade. Na França, por exemplo, essas instruções se chamavam cahiers de dolèance (cadernos de queixas).

Mandato livre. A partir da Revolução Francesa e dos escritos de Burke na Inglaterra, o titular de mandato passa a ser visto como representante de todo o povo e não apenas dos seus eleitores, surgindo o mandato livre, pelo qual o representante não se vincula a instruções de seus eleitores.

“O Parlamento não é um congresso de embaixadores que defendem interesses distintos e hostis, interesses que cada um de seus membros deve sustentar, como agente e advogado, contra outros agentes e advogados, mas uma assembléia deliberativa de uma nação, com um interesse: o da totalidade, onde o que deve valer não são os interesses e preconceitos locais, mas o bem geral que resulta da razão geral do todo. Elegei um deputado, mas quando o haveis escolhido, ele não é o deputado por Bristol, e sim um membro do parlamento.” (Edmund Burke – 1729-1797)


Características do Mandato Político. Atualmente, o mandato político é livre (não vinculado), geral (para qualquer assunto de competência do representante), autônomo (os atos do representante não dependem de confirmação), irresponsável (o representante não deve explicações por suas decisões) e irrevogável (com exceção do recall, que não existe no Brasil.

Bibliografia
Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 79 a 83.
Leituras complementares: Paulo Bonavides, Ciência Política, Cap. 19, itens 3 e 4, e Cap. 20. F. Weffort (org.), Os clássicos da política, vol. 2, capítulos sobre Burke e Stuart Mill.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

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Resumo 19 – Democracia

IV – Estado e Governo

1. Regimes de Governo:

a) Democracia


“Nós aqui presentes solenemente afirmamos que esses homens não morreram em vão, que esta nação, com a graça de Deus, verá o nascimento de uma nova Liberdade, e que o governo do povo, pelo povo e para o povo jamais desaparecerá da face da terra” (A. Lincoln, Discurso em Gettysburg, 1863).



Classificações. Há muita confusão quando se fala de regimes, formas e sistemas de governo. Utilizaremos neste curso a classificação mais atual e que está de acordo com a Constituição vigente:
regimes de governo: democracia e autocracia
formas de governo: monarquia e república
sistemas de governo: parlamentarismo e presidencialismo

Regimes de Governo – Introdução. O poder soberano do Estado é exercido através do governo. Os regimes de governo são democracia e autocracia (também conhecida como ditadura, despotismo, totalitarismo etc.), conforme o governo seja mais ou menos autoritário, tenha mais ou menos participação popular e garanta mais ou menos os direitos fundamentais. Neste e nos próximos capítulos, estudaremos a democracia e seus institutos. Em seguida, veremos a autocracia.


Democracia.
• Origem do termo: do grego demos (povo), kratos (poder)
• Segundo Lincoln, democracia é o governo do povo (o poder pertence ao povo), pelo povo (é exercido pelo povo) para o povo (em benefício do povo)


Classificação de Aristóteles. Aristóteles (384-322 a.C.) classificou os governos segundo o número de governantes e a modo de exercício do poder. Para ele, as formas boas de governo eram exercidas em benefício do bem comum, e as formas más ou degeneradas seriam as exercidas para favorecer apenas aqueles que governam.
• governo de um: monarquia (forma boa) e tirania (forma má, exercida no interesse do tirano)
• governo de poucos: aristocracia (governo dos virtuosos, forma boa) e oligarquia (forma má, voltada para o bem dos poucos que governam)
• governo de muitos: politéia (“constituição”, forma boa, exercida no sentido do bem comum) e democracia (forma degenerada, dominada pelos demagogos e exercida no interesse dos pobres contra os ricos).

Observa-se que, para Aristóteles, a democracia era uma forma degenerada de governo, porque ele se baseava no que ocorria em Atenas na época, mas esse sentido mudou com o tempo e a democracia passou a ser considerada o melhor tipo de governo.

Democracia Antiga. Democracia era o regime de governo das cidades gregas, especialmente Atenas, por volta de V e IV a. C. Possuía as seguintes características básicas:
• exercício direto do poder pelo povo (decisões políticas tomadas em assembléias na praça pública)
• alto grau de participação dos cidadãos
• conceito restrito de cidadania (exclusão das mulheres, escravos etc.)
• liberdade política x limitação da liberdade individual (liberdade dos antigos x liberdade dos modernos)
isagoria (igual direito à palavra nas assembléias), isonomia (igualdade perante a lei) e isotimia (igualdade no acesso aos cargos públicos)
• cargos públicos preenchidos preferencialmente por sorteio e exercidos por tempo limitado

Discurso de Péricles

"Nosso regime político é a democracia e assim se chama porque busca a utilidade do maior número e não a vantagem de alguns. Todos somos iguais perante a lei, e quando a cidade outorga honraria o faz para recompensar virtudes e não para consagrar privilégios.

O governo favorece a maioria em vez de poucos – por isso é chamado de democracia. Se consultarmos a lei, veremos que ela garante justiça igual para todos em suas diferenças; quanto à condição social, o avanço na vida pública depende da reputação de capacidade. As questões de classe não têm permissão de interferir no mérito, tampouco a pobreza constitui um empecilho: se um homem está apto a servir ao estado, não será tolhido pela obscuridade da sua condição.

Cultivamos o refinamento sem extravagância, e o conhecimento sem afetação. Empregamos a riqueza mais para o uso do que para a exibição e situamos a desgraça real da pobreza não no reconhecimento do fato, mas na recusa de combatê-la.

Diferentemente de qualquer outra comunidade, nós, atenienses, consideramos aquele que não participa de seus deveres cívicos não como desprovido de ambição, mas sim como inútil.

Em vez de considerarmos a discussão como uma pedra no caminho da ação, a consideramos como uma preliminar indispensável de qualquer ação sábia. Em resumo, afirmo que, como cidade, somos a escola de toda a Grécia..."
(Trechos do discurso em homenagem aos atenienses mortos na guerra do Peloponeso, 430 a. C.)

Democracia Moderna. Depois do apogeu na Grécia, a democracia foi praticamente esquecida e só voltou a ser lembrada com o surgimento do Estado Moderno, tendo como objetivos a luta contra o absolutismo e a afirmação dos direitos naturais (vida, liberdade, igualdade etc.). A democracia moderna se diferencia da antiga pela extensão da cidadania (busca do sufrágio universal) e pela limitação da participação direta (democracia representativa)

Histórico. A democracia ressurge no Estado Moderno como conseqüência das revoluções burguesas (Inglaterra, EUA, França) e do constitucionalismo, sob a influência de filósofos jusnaturalistas como Locke, Montesquieu e Rousseau.

Revolução Inglesa (1689). Sob a influência de Locke, editou o Bill of Rights, garantindo os direitos naturais, limitando o poder da monarquia e afirmando o Legislativo, composto de representantes do povo, como o poder supremo, a quem cabe estabelecer as leis, segundo a vontade da maioria.

Revolução Americana (1776). Aplicou a lição de Locke pela qual é dever do governo respeitar os direitos naturais, sem o que o povo tem direito à rebelião. De Montesquieu, aplicou o princípio da separação de poderes como forma de limitação do poder, estabelecendo os poderes legislativo, executivo e judiciário como harmônicos e independentes, sem que um prevaleça sobre o outro. Devido à inexistência da nobreza, teve maior participação popular.

Revolução Francesa (1789). Derrubou a monarquia absolutista aplicando a teoria democrática de Rousseau de que a soberania pertence ao povo (nação) e a lei deve ser expressão da vontade geral. Consagrou os direitos naturais e aplicou a teoria da separação de poderes sem os mecanismos de freios e contrapesos previstos nos EUA. Teve um caráter mais universalista do que as outras revoluções, espalhando-se por Europa e Américas.

“A Democracia na América”. Este é o título de um livro clássico do filósofo francês Alexis de Tocqueville, que, em vista aos EUA em 1831, ficou impressionado com o funcionamento da democracia norte-americana, caracterizada pela intensa participação dos cidadãos, pela igualdade de oportunidades e pela prevalência da soberania popular mediante eleições livres. Para ele, a democracia política, social e econômica ali vigente era o futuro da humanidade. Ficou famosa sua observação de que os males da democracia se resolvem com mais democracia, nunca com menos.

Século XIX. No século XIX prevaleceu a democracia liberal, com a garantia das liberdades públicas e da igualdade apenas formal (perante a lei). Exceto nos EUA, a participação popular, limitada à eleição de representantes, era muito pequena, devido às limitações do sufrágio em razão da renda (voto censitário) e da escolaridade (a maioria da população era de analfabetos) e do sexo (proibição do sufrágio feminino).

Século XX. O início do século XX foi marcado pelo desprestígio da democracia liberal, que sofria ataques tanto dos socialistas como dos fascistas. Os socialistas criticavam a democracia formal, que não garantia a participação popular e a igualdade real. Os fascistas criticavam a fraqueza dos governos democráticos para tomar decisões essenciais ao Estado. Ambos pregavam as virtudes da ditadura, seja do proletariado, seja do líder carismático (duce ou führer).

Pós-guerra. A democracia só recupera seu prestígio após o fim da II Guerra Mundial, mas agora com a exigência de ampla participação popular (sufrágio universal) e garantia dos direitos civis, políticos e sociais. Atualmente, nenhum Estado, mesmo os totalitários como Coréia do Norte, Cuba e Irã, admite ser antidemocrático.

Como identificar uma democracia?
Segundo Dallari, a democracia atual tem os seguintes requisitos:
supremacia da vontade popular: eleições livres e periódicas, sufrágio universal, prestação de contas, transparência, outras formas de participação popular como plebiscito, referendo, iniciativa popular, orçamento participativo etc.
preservação da liberdade: limitação do poder, liberdade de imprensa e outras liberdades públicas, oposição livre, respeito às minorias etc.
igualdade de direitos: garantia de acesso livre e igualitário aos direitos políticos, civis e sociais.

Democracia como técnica. Segundo o filósofo italiano Norberto Bobbio (1909-2004), a democracia é ao mesmo tempo uma técnica e um valor. Como técnica, ou seja, sob o ponto de vista formal, ela é definida como “regras de procedimento para a formação de decisões coletivas, em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados”. Bobbio ensina que “apenas onde essas regras são respeitadas o adversário não é mais um inimigo (que deve ser destruído), mas um opositor que amanhã poderá ocupar o nosso lugar”. Sob esse ponto de vista, a vontade da maioria deve prevalecer, exceto quando não há respeito às regras do jogo, ou seja, não se pode usar a democracia para destruir a democracia.

Democracia como valor. Segundo Bobbio, a democracia é substancialmente um valor, isto é, um conjunto de fins (e não apenas de meios), dentre os quais sobressai a finalidade da igualdade jurídica, social e econômica.

“Democracia não é só a escolha por votos, mas é o casal ter um diálogo bom e respeitoso, o patrão ouvir os empregados e aceitar suas sugestões, o professor ou o pai escutar o aluno ou o filho e não ter vergonha de pedir desculpas. Democracia, aqui, significa um concentrado de atitudes, em que se incluem a conversa limpa, honesta e sincera, a renúncia a ser o dono da verdade e, finalmente, as boas maneiras. Ser educado pode ser um traço essencial da democracia, porque é um modo de dizer que o outro vale tanto quanto nós” (Renato Janine Ribeiro)

A democracia é possível?
• para Rousseau, não existe e talvez nunca existirá democracia perfeita, a não ser para “um povo de deuses”
• segundo Bobbio, existem regimes menos e mais democráticos. É um ideal a ser sempre buscado, até porque ao contrário do despotismo, que não muda, estar sempre em transformação é da natureza da democracia.

A democracia é o melhor regime?

"Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos" (Churchill)

“Quando me perguntam se uma nação está madura para ser livre, respondo: existe um homem maduro para ser déspota?” (Lord John Russel)

“O despotismo se apresenta freqüentemente como o reparador de todos os males sofridos; é o apoio da razão, o sustentáculo dos oprimidos e o instaurador da ordem. Os povos adormecem no seio da prosperidade momentânea que ele propicia; e, quando despertam, estão na miséria. A liberdade, ao contrário, comumente nasce no meio das tempestades, estabelece-se penosamente entre as discórdias civis e não é senão quando já está velha que se pode conhecer seus benefícios” (A. Tocqueville).

“Em matéria de desonestidade, a diferença entre o regime democrático e a ditadura é a mesma que separa a ferida que corrói a carne por fora e o tumor invisível que corrói por dentro. As feridas democráticas curam-se pelo sol da publicidade, com o cautério da opinião pública livre; ao passo que os cânceres profundos da ditadura apodrecem internamente o corpo social e são por isso mesmo muito mais graves” (Clemenceau)

“Nenhuma guerra explodiu até agora entre Estados dirigidos por regimes democráticos. O que não quer dizer que os Estados democráticos não tenham feito guerras, mas apenas que jamais fizeram entre si” (Norberto Bobbio)

Bibliografia
Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 75 a 78.
Leituras complementares: M. Y. Finley, Democracia antiga e moderna. Norberto Bobbio, Dicionário de Política, verbete “democracia” e O futuro da democracia – uma defesa das regras do jogo. Renato Janine Ribeiro, A democracia (Coleção Folha Explica, ed. Publifolha).

Gabaritos

GABARITOS Ciência Política – 1º Semestre - 2010

Com um ligeiro atraso, aí vão os gabaritos da prova do primeiro semestre:

1º. Noturno, Prova 1
1-A 2-C; 3-B; 4-D; 5-E; 6-D; 7-C; 8-D; 9-B; 10-D

1º. Noturno, Prova 2
1-E 2-C; 3-A; 4-D; 5-D; 6-E; 7-D; 8-E; 9-B; 10-D

1º. Diurno, Prova 1
1-C, 2-E, 3-A, 4-B, 5-D, 6-B, 7-D, 8-B, 9-E, 10-C

1º. Diurno, Prova 2
1-B, 2-D, 3-B, 4-C, 5-E, 6-A, 7-B, 8-B, 9-A, 10-E