sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Gabaritos da prova final

GABARITOS Ciência Política – Prova Final - 2011

1º. Diurno, Prova 1
1-B; 2-D; 3-B; 4-B; 5-E; 6-D; 7-D; 8-D; 9-D; 10-D

1º. Diurno, Prova 2
1-A; 2-E; 3-D; 4-A; 5-B; 6-A; 7-D; 8-D; 9-C; 10-D


1º. Noturno, Prova 1
1-D; 2-E; 3-A; 4-C; 5-B; 6-C; 7-D; 8-A; 9-A; 10-D

1º. Noturno, Prova 2
1-C; 2-D; 3-E; 4-D; 5-C; 6-D; 7-A; 8-D; 9-A; 10-B

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Aviso sobre a prova final

A prova final constará de 10 questões objetivas (múltipla escolha), abrangendo toda a matéria do ano, constante dos resumos 1 a 26 publicados neste blog.

A nota mínima para aprovação é 5.

Boa sorte a todos!

Prof. Marum

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Gabarito - Noturno

*Atenção, esta é a versão já corrigida do gabarito.

GABARITOS Ciência Política – 2º Semestre - 2011

1º NOTURNO

Prova 1
1-C; 2-B; 3B-; 4-D; 5-D; 6-A; 7-D; 8-C; 9-A; 10-E

Prova 2
1-E; 2-C; 3-A; 4-E; 5-B; 6-D; 7-A; 8-E; 9-B; 10-D

Prova 3
1-D; 2-B; 3-E; 4-C; 5-E; 6-B; 7-B; 8-C; 9-E; 10-A

Prova 4
1-C; 2-A; 3-A; 4-D; 5-A; 6-E; 7-C; 8-A; 9-B; 10-E

sábado, 19 de novembro de 2011

Gabarito - Diurno

Eis o gabarito da prova semestral:
Prova 1 - 1-D; 2-E; 3-A; 4-C; 5-B; 6-E; 7-C; 8-B; 9-A; 10-D
Prova 2 - 1-A; 2-E; 3-B; 4-C; 5-B; 6-E; 7-D; 8-D; 9-B; 10-A
Prova 3 - 1-B; 2-E; 3-E; 4-C; 5-E; 6-B; 7D-; 8-D; 9-E; 10-B
Prova 4 - 1-A; 2-A; 3-E; 4-C; 5-D; 6-C; 7-B; 8-D; 9-E; 10-E

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Matéria para a prova

Caras e caros,

Conforme eu já disse várias vezes em sala de aula, a matéria para a prova semestral será a do segundo semestre, resumos 18 a 26 deste blog, com as respectivas leituras essenciais indicadas na bibliografia. Haverá também uma pergunta sobre o filme "A Onda".

Serão 10 perguntas objetivas, com cinco alternativas, no mesmo estilo do primeiro semestre.

A nota do trabalho (para quem apresentou) comporá a nota semestral.

Quem não fizer média anual 7, terá de fazer a prova final.

Boa sorte e mãos à obra!

domingo, 9 de outubro de 2011

Resumo 26 - Formas de Estado

IV – Estado e Governo

9. Formas de Estado


“Estamos a cada passo reduzindo o país a Estado unitário (...). A União é aqui o Estado-Providência. Acham-no capaz de resolver, milagrosamente, todos os problemas, e entregam-lhe, de mãos atadas, a federação” (Ataliba Nogueira, 1901-1983)

Introdução. A classificação das formas de Estado refere-se à divisão espacial do poder, isto é, a distribuição geográfica do poder no território do Estado. Segundo essa classificação, há Estados Unitários e Estados Federais. Os Estados Unitários são centralizados, com todos os órgãos administrativos reportando-se a um poder central, não havendo subdivisões com autonomia político-administrativa. Os Estados Federais são descentralizados, divididos em estados-membros ou províncias, com autonomia política e administrativa. Uma terceira forma de Estado vem surgindo atualmente: o Estado Regional, em que algumas regiões ganham autonomia político-administrativa, mas não por direito próprio, e sim por concessão do poder central.

Uniões de Estados. O estudo das formas de Estado pressupõe a noção de uniões de Estados. Ao longo da história, sempre houve a união de Estados, seja para fins de defesa, de comércio etc. Exemplos dessas uniões são a Liga do Peloponeso (união bélica de cidades gregas como Esparta, Corinto etc., entre os séculos VI e V a.C.), a Liga Hanseática (união de cidades mercantis do norte da Europa entre os séculos XIII e XVII), a União Européia etc..

Espécies de uniões. Conforme Sahid Maluf, as uniões de Estados podem ser classificadas em dois tipos: uniões iguais, quando os Estados a compõem espontaneamente e em igualdade de condições, e uniões desiguais, nem sempre espontâneas e com prevalência de um Estado sobre outro(s).

a) Uniões Iguais
Confederação: união de dois ou mais Estados, através de um tratado, para fins de comércio, defesa etc., com possibilidade de dissolução. Ex.: OTAN, NAFTA, Mercosul.
União Pessoal: própria de monarquias, ocorre quando dois ou mais Estados, teoricamente mantendo a soberania, são governados, de forma acidental e temporária, por um mesmo rei. Ex.: Portugal e Espanha, 1616-1640.
União Real: também própria de monarquias, ocorre quando dois ou mais Estados são reunidos num único Estado soberano e sob um único monarca, conservando apenas os nomes e a autonomia administrativa, mas abrindo mão da soberania. Ex.: “Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte”, composto de Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte, e Áustria-Hungria entre 1867-1918.
Federação: dois ou mais Estados se unem de forma permanente formando um novo Estado soberano, abrindo mão das soberanias individuais e mantendo apenas autonomia político-administrativa.

b) Uniões Desiguais
Protetorado: um Estado passa a proteger outro, que mantém soberania limitada. Ex.: os protetorados que vigoraram no século XX, como o da Inglaterra sobre o Egito e dos EUA sobre as Filipinas.
Vassalagem: um Estado domina outro e passa a explorá-lo, permitindo soberania mais ou menos limitada. Ex.: a França invadida pela Alemanha em 1940-44.
Império: um Estado predomina sobre vários outros, que mantém soberania limitada. Ex.: Império Romano.

c) Commonwealth Britânica: união sui generis, misto de uniões reais, pessoais e confederação

Formas de Estado. As formas de Estado tradicionalmente têm sido o Estado Unitário e a Federação. Atualmente, está surgindo um tertium genus, o Estado Regional, ainda não aceito por todos os teóricos. O que caracteriza a forma de Estado é a divisão espacial do poder.
Estado Unitário: caracterizado pela centralização política e administrativa, em que todas as unidades de poder reportam-se ao poder central. Ex.: França, Uruguai etc.
Estado Federal: caracterizado pela autonomia política e administrativa dos entes federativos, chamados de estados federados, províncias ou cantões. Ex.: EUA, Brasil, Argentina, Alemanha etc.
Estado Regional: forma que vem surgindo atualmente, com autonomia administrativa de algumas regiões por concessão do poder central. Ex.: Portugal, Espanha, Itália


Federação. Etimologia (do latim foedus, foedoris: pacto, união, aliança). Definição: forma de Estado pactuada através de uma Constituição e caracterizada pela união indissolúvel de Estados, que abrem mão de sua soberania, mantendo apenas a autonomia política e administrativa, com repartição de competências e rendas. A Federação normalmente decorre de uma união de Estados, mas também pode ser formada através da descentralização de um Estado unitário.

Histórico. A forma federativa de Estado foi criada nos EUA pela Constituição de 1787, para substituir a Confederação surgida em 1776 com a independência das 13 Colônias. Inicialmente, as 13 colônias eram 13 Estados independentes, soberanos e com Constituições próprias, unidos por um tratado denominado “Artigos da Confederação”. Na Convenção da Filadélfia, as ex-colônias, visando o fortalecimento e uma melhor organização do governo, abriram mão de ser Estados soberanos e se uniram sob uma Constituição num único Estado, dividido em estados federados com autonomia política e administrativa. Posteriormente, a vitória da União contra os Confederados na Guerra da Secessão (1861-1865) estabeleceu o princípio da indissolubilidade do pacto federativo.

“O Federalista”. A Federação norte-americana foi teorizada por James Madison, Alexander Hamilton e John Jay, que divulgaram suas idéias em artigos jornalísticos publicados sob o pseudônimo comum de Publius, depois reunidos na importante obra O Federalista (“The federalist papers”). A intenção era convencer o povo dos Estados norte-americanos a ratificar a Constituição aprovada na Convenção da Filadélfia (1787), especialmente da vantagem de abrir mão das soberanias locais em favor da União Federal. Posteriormente, James Madison (1751-1836) se tornaria presidente dos EUA. Alexander Hamilton (1757-1804) se tornaria secretário (equivalente a ministro) do Tesouro e morreria precocemente num duelo. John Jay (1745-1829) se tornaria o primeiro presidente da Suprema Corte dos EUA.

“Devo confessar que neste, como em outros casos, há um meio-termo, aquém e além do qual se situam os inconvenientes. Aumentando em demasia o número de eleitores, o representante ficará muito pouco familiarizado com as condições locais e com os interesses menos importantes; reduzindo-se demais aquele número, tais condições e interesses passarão a exercer descabida influência sobre o representante, impedindo-o de avaliar e defender os grandes objetivos nacionais. A Constituição Federal apresenta a esse respeito uma feliz combinação: os interesses maiores e de conjunto são tratados pelo legislativo nacional; os locais e particulares, pelos estaduais” (Publius, aliás, James Madison).

“Dentre os homens que derrubaram as liberdades das repúblicas, a maior parte começou sua carreira bajulando o povo; começaram demagogos e acabaram tiranos” (Publius, aliás, Alexander Hamilton).


Características do Estado Federal
• nascimento de um novo Estado
• base jurídica numa Constituição de tipo rígida
• proibição de dissolução e secessão
• soberania do Estado Federal (União) e autonomia (leis e governo próprios) dos Estados-membros (também chamados de províncias, cantões etc.) (no Brasil, os municípios também possuem autonomia)
• distribuição de competências e rendas
• compartilhamento do poder político (não há hierarquia entre os entes federativos)
• Legislativo bicameral, com um Senado representando os Estados-membros
• Interessante notar que no Brasil os municípios também possuem autonomia político-administrativa

Modos de Formação
Federação centrípeta: Estados que se unem em busca das vantagens da centralização (EUA)
Federação centrífuga: busca da descentralização e da moderação do poder (Brasil)


A crise do federalismo. Atualmente, tem-se visto um declínio da autonomia dos entes federados e uma tendência à centralização do poder nas mãos do governo na União, o que prejudica o caráter descentralizador e de moderação do poder que se espera numa federação. Esse fenômeno ocorre especialmente no Brasil, na Argentina e em outras federações com tendências hiperpresidencialistas.

A União Européia. Para alguns teóricos, a União Européia, que ainda é uma confederação, é uma federação em construção. Já há até uma Constituição Européia sendo votada. Mas a federação somente se consolidará se os Estados europeus abrirem mão integralmente da sua soberania, o que dificilmente ocorrerá, principalmente agora, com a crise econômica dos países da zona do Euro.

Para Pensar. Você concorda com a centralização do poder que vem ocorrendo no Brasil, ou acha que seria melhor uma descentralização, com o fortalecimento das unidades federadas?

Bibliografia

Leitura essencial:

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 139 a 145.

Leituras complementares:
DALLARI, Dalmo de Abreu. O Estado Federal, Ed. Ática.
MADISON, James; HAMILTON, Alexander & JAY, John. Os artigos federalistas, Ed. Nova Fronteira.
MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado, Caps. XXXI e XXXII.
WEFFORT, Francisco (org.). Os clássicos da política, vol. 1, capítulo sobre O Federalista.

sábado, 8 de outubro de 2011

Apresentação de Trabalhos

Já foi iniciada a apresentação dos trabalhos semestrais. A ordem de apresentação é livre, então quem esitver com o trabalho pronto já pode fazer a apresentação. O prazo final para as apresentações será 31 de outubro (noturno) e 03 de novembro (manhã).

Como já foi avisado, a parte referente às características das Constituições é opcional.

Atividade Complementar


Visando reforçar o cumprimento de um dos objetivos da disciplina Ciência Política, que é o estímulo à participação política dos alunos, serão atribuídas horas de atividades aos alunos que:

a) se filiarem ou já estiverem filiados a um partido político (2 horas)
b) estiverem participando de um órgão de direção partidária (2 horas)
c) participarem de uma convenção partidária (2 horas)

A comprovação da atividade deverá ser feita mediante apresentação ao professor de certidão da Justiça Eleitoral ou declaração de dirigente de partido.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Aviso sobre o trabalho semestral

A partir desta semana, os trabalhos já poderão ser apresentados. Cada dupla terá 5 minutos para a apresentação oral e deverá entregar um resumo com no máximo duas páginas digitadas.

Devido à dificuldade encontrada pelos alunos para pesquisar as características da Constituição de alguns Estados, essa parte do trabalho fica opcional.

Resumo 25 - Sistemas de Governo


IV – Estado e Governo


8. Sistemas de Governo: Parlamentarismo e Presidencialismo

Introdução. Segundo a Constituição brasileira e a maioria dos autores, os sistemas de governo são o Parlamentarismo e o Presidencialismo. Os sistemas se diferenciam basicamente quanto ao modo de funcionamento do governo e a relação entre os poderes Executivo e Legislativo. No Presidencialismo, a separação entre os poderes é bem marcada, com ênfase na independência. No Parlamentarismo, vigora uma estreita cooperação entre os poderes, com ênfase na harmonia.

Parlamentarismo


“O parlamentarismo educaria os partidos e os partidos educariam o povo” (Paulo Bonavides)


Introdução. O Parlamentarismo é o sistema em que o Poder Executivo funciona em colaboração com o Legislativo e depende da confiança e da aprovação deste. Esse sistema foi implantando gradualmente durante séculos na Inglaterra, sendo fruto da evolução dos costumes políticos ingleses e não de uma formulação teórica. Essa evolução está ligada à história política da Inglaterra, em que o Parlamento, especialmente a Câmara dos Comuns, composta por representantes do povo, foi retirando do rei parcelas de seu poder originalmente absoluto. Na sua atual configuração, o Parlamento é a sede do Poder Legislativo, mas nele também funciona o Poder Executivo, chefiado pelo primeiro-ministro, que é o líder do partido majoritário.

Evolução histórica.
• 1213, o rei João Sem Terra, um monarca absolutista, cria um Conselho Privado, formado nobres, para o aconselharem
• 1215: João Sem Terra é obrigado a assinar a Magna Carta, em que reconhece direitos dos ingleses e aceita submeter a cobrança de impostos à aprovação dos representantes do povo
• 1265: criação do Parlamento (casa dos representantes do povo, sede do Poder Legislativo), após uma revolta de nobres chefiados por Simon de Monfort
• 1295: oficialização do Parlamento por Eduardo I
• 1332: separação do Parlamento em duas Casas: Câmara dos Lordes e Câmara dos Comuns
• 1640: guerra civil entre partidários do rei e do Parlamento, com vitória das forças parlamentares e execução do rei Carlos I
• 1649: instituição de uma república (na verdade uma ditadura) liderada por Cromwell
• 1660/1688: restauração da monarquia
• 1688/89: Revolução Gloriosa, com a prevalência do Parlamento sobre a Coroa e a criação do Gabinete (Conselho de Ministros), composto por parlamentares, para auxiliar o rei;
• 1689: o príncipe holandês Guilherme de Orange assume a coroa após assinar um Bill of Rights (carta de direitos do povo inglês), que representa o fim do absolutismo na Inglaterra
• 1714: assunção do príncipe alemão Jorge de Hanover como rei e de Lorde Walpole como chefe do Gabinete de Ministros (“primeiro ministro”)
• o rei, que não falava inglês e não se interessava pela política inglesa, deixa de ir ao Parlamento e começa a se afastar das decisões políticas, assumidas pelo primeiro-ministro
• separação entre a Chefia de Estado (rei) e a Chefia de Governo (primeiro-ministro)
• 1782: demissão do primeiro-ministro Lorde North por pressão do Parlamento, após o fracasso na guerra de independência dos EUA
• exigência da concordância da Câmara dos Comuns para a nomeação do Primeiro-Ministro
• surgimento da responsabilidade política (o Gabinete cai se perder a confiança do Parlamento)
• século XIX: praxe de o primeiro-ministro ser indicado pelo partido majoritário na Câmara dos Comuns
• o rei passa a arbitrar as crises entre o Gabinete e o Parlamento, podendo aconselhar a demissão do primeiro ou a dissolução do segundo, convocando eleições antecipadas
• enfraquecimento da Câmara dos Lordes
• consolidação do Parlamentarismo na Inglaterra e sua implantação em outros países europeus
• século XX: o Parlamentarismo é o sistema mais utilizado nos Estados democráticos, sendo compatível tanto com a Monarquia (ex.: Espanha, Noruega, Japão etc.) como com a República (ex.: Alemanha, Portugal, Itália etc.)


Características principais. Após essa lenta evolução histórica, o sistema parlamentarista desenvolveu as seguintes características básicas, que podem variar de país para país:

a) Distinção entre chefe de Estado e chefe de Governo:
• o chefe de Estado é o rei ou o presidente da República, que tem a função de representar o Estado e servir como árbitro das disputas políticas, nomeando ou aconselhando a demissão do primeiro-ministro e do Gabinete, aprovando a dissolução do Parlamento e convocando eleições antecipadas (“o rei reina, mas não governa”; “o presidente preside, mas não governa”)
• havendo presidente da República, é recomendável que este tenha um mandato longo e seja eleito indiretamente
• o chefe de Governo é o primeiro-ministro (também chamado de chanceler ou premiê), que deve ser o líder da maioria no Parlamento e formar o Gabinete de Ministros com membros dessa maioria

b) Chefia do Governo com responsabilidade política:
• o primeiro-ministro precisa manter a liderança da maioria parlamentar para continuar no cargo
• onde não prevalece o bipartidarismo de tipo inglês, o governo deve ser formado por uma coalizão de partidos que represente a maioria do Parlamento; se isso não for possível, o Parlamento é dissolvido e são convocadas novas eleições
• o primeiro-ministro e o Gabinete participam das sessões do Parlamento, prestando contas e sendo interpelados constantemente
• caso alguma medida do Governo seja rejeitada pelo Parlamento, o primeiro-ministro pode pedir um voto de confiança para demonstrar que ainda lidera a maioria do Parlamento; se o voto for rejeitado, o Gabinete deve se demitir
• qualquer parlamentar pode pedir um voto de desconfiança ao Gabinete, que, se for aprovado, tem o mesmo efeito da rejeição do voto de confiança (o Gabinete deve se demitir)

c) Possibilidade de dissolução do Parlamento:
• perdida a confiança do Parlamento, o Gabinete deve renunciar; porém, o primeiro-ministro, sentindo que maioria do Parlamento não representa a opinião pública predominante, também pode ao chefe de Estado a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições antecipadas
• esse mecanismo faz com que o Legislativo também aja com responsabilidade política

d) Outras características do Parlamentarismo:
shadow cabinet: a oposição tem grande importância e, normalmente, mantém um “gabinete sombra”, com parlamentares especialistas em diversas áreas, para fiscalizar o Gabinete e sempre pronto a assumir, caso o governo caia
fair play (jogo limpo): valorizado e praticado entre situação e oposição, devido à possibilidade constante de alternância no poder, por queda do governo ou dissolução do Parlamento
• burocracia estável e meritocrática, com poucos cargos de livre nomeação, em razão da permanente possibilidade de alteração do partido ou coalizão no governo

Espécies. A doutrina identifica as seguintes espécies principais de Parlamentarismo:
Parlamentarismo Dualista (ou clássico): o Chefe de Estado tem algumas atribuições políticas e o primeiro-ministro depende também da sua confiança (praticado no início do Parlamentarismo inglês)
Parlamentarismo Monista: o Chefe de Estado não atribuições políticas e apenas arbitra as disputas políticas (sistema inglês atual)
Sistema francês (ou “semi-presidencialismo”): o Chefe de Estado (presidente da República) tem muitas atribuições políticas e de governo

Parlamentarismo no Brasil. O Brasil viveu duas experiências parlamentaristas. A primeira foi durante o 2º Reinado, implantado informalmente, porque não estava previsto na Constituição, e chamado de “Parlamentarismo às avessas”, porque o imperador escolhia livremente o primeiro-ministro, independentemente do resultado das eleições, e podia dissolver o Parlamento quando bem entendesse. Em 1961, o Parlamentarismo foi implantado às pressas por emenda constitucional para superar as resistências dos militares à posse de João Goulart após a renúncia de Jânio Quadros. Goulart nunca se conformou com isso e, em 1963, conseguiu convocar um plebiscito em que o povo majoritariamente votou pelo retorno do sistema presidencialista, o que precipitou o golpe militar de 1964. Em 1993, por determinação da Constituição de 1988, foi convocado um novo plebiscito, e o povo novamente optou pela permanência do Presidencialismo.

Prós e contras. Em favor do Parlamentarismo, argumenta-se que se trata de um sistema mais democrático, na medida em que exige uma sintonia constante com a opinião pública, racionaliza o poder, é menos personalista, valoriza o debate político e favorece os políticos mais capacitados. Contra esse sistema argumenta-se com a fragilidade e a instabilidade dos governos. Para os seus defensores, porém, a flexibilidade do sistema é vantajosa, porque garante mecanismos racionais de resolução das crises, sem revoluções, sem traumas e sem quebra da legalidade. Alguns também apontam o constante debate como um empecilho à eficiência do governo.


Presidencialismo

“O presidencialismo brasileiro não é senão a ditadura em estado crônico, a irresponsabilidade geral, a irresponsabilidade consolidada, a irresponsabilidade sistemática do Poder Executivo (...) o mais russo, o mais asiático, o mais africano de todos os regimes” (Ruy Barbosa).

Introdução. No sistema presidencialista, há uma separação mais marcada entre os Poderes Executivo e Legislativo, pois a ênfase é na independência dos Poderes. O presidente da República acumula as funções de chefe de Estado e de Governo, tem mandato fixo e não depende da confiança do Parlamento.

Origem. O Presidencialismo é uma criação norte-americana, tendo sido introduzido pela Constituição de 1787, sob a influência da teoria da separação de poderes de Montesquieu e da repulsa à monarquia inglesa. O presidente seria uma espécie de rei com mandato temporário. Dali espalhou-se para os demais Estados das Américas e depois para outros países.

Características.
a) Chefia de Estado e de Governo exercidas pela mesma pessoa: o presidente da República acumula as duas funções
b) Chefia unipessoal do Executivo: os ministros são meros auxiliares do presidente, nomeados e demitidos livremente por ele e sem responsabilidade política perante o Parlamento
c) Eletividade do presidente: o presidente é eleito para o cargo, diferentemente do primeiro-ministro, que é escolhido por ser o líder da maioria no Parlamento
d) o presidente tem mandato com prazo determinado: o presidente governa por um prazo fixo e não tem responsabilidade política, perdendo o cargo apenas se cometer crime político e sofrer impeachment (condenação pelo Poder Legislativo)
e) o presidente participa do processo legislativo pelos poderes de iniciativa e de veto: o presidente pode mandar projetos de lei ao Legislativo e vetar as leis aprovadas por este, mas não participa dos debates durante o processo

Prós e Contras. Em favor do Presidencialismo, argumenta-se com a estabilidade do governo, o fortalecimento e a independência do Poder Executivo e a maior eficiência de um governo que não necessita debater constantemente suas decisões no Parlamento. Contra o Presidencialismo, argumenta-se com a falta de responsabilidade política do presidente, que continua no cargo mesmo se seu governo for medíocre ou incompetente. Como não precisa de maioria no Parlamento para formar o Gabinete, o presidente precisa formar e manter essa maioria posteriormente para ter seus projetos aprovados, o que normalmente se faz com a negociação de cargos com os partidos da base governista (no Brasil, essa prática foi chamada pelo cientista político Sergio Abranches de “presidencialismo de coalizão”). O Presidencialismo também é caracterizado pelo chamado spoils system (sistema de espólios), também conhecido como patronage system, instituído nos EUA por Andrew Jackson (1829-1837). Trata-se, segundo Max Weber, da atribuição de todos os postos da administração federal ao séquito do candidato presidencial vitorioso. Ainda segundo seus críticos, o Presidencialismo é personalista e concentra poderes excessivos nas mãos do presidente, possibilitando a expressão de tendências autoritárias, como constantemente ocorre na América Latina, caracterizada pelos chamados “caudilhos”. O cientista político argentino Guillermo O’Donnell denominou essa tendência latino-americana de “democracia delegativa”, pois, uma vez eleito, o presidente não sofre controles efetivos dos demais Poderes. Esse excesso de poderes do presidente, que também ocorre em países asiáticos, como Rússia de Putin, é chamado de “Hiperpresidencialismo” pelo cientista político Sérgio Fausto. Enfim, os críticos do Presidencialismo argumentam que ele só funciona bem nos EUA.

Para pensar. Você acha que o Parlamentarismo seria o sistema de governo mais adequado para o Brasil?

Bibliografia

Leitura essencial
:
DALLARI, Dalmo de Abreu, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 126 a 133.

Leituras complementares:
BONAVIDES, Paulo. Paulo. Ciência Política, Caps. 21 e 22.
CAETANO, Marcelo. Direito Constitucional, Forense, Parte I, Cap. I.
CHURCHILL, Winston. História dos povos de língua inglesa, Vol. 3, Livro VIII.
MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado, Caps. XLIII e XLIV.

Filme: “As Loucuras do Rei George” (The Madness of King George, Inglaterra, 1994).

domingo, 25 de setembro de 2011

Mudanças à vista no exame da OAB

Notícia publicada no jornal Folha de S. Paulo mo dia 23/09 informa que a OAB pretende incluir Ciência Política, Direitos Humanos e outras disciplinas fundamentais no exame da OAB.

OAB cria comissão para implementar mudança em prova

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) instaurou uma comissão para implementar mudanças no exame de ordem, como a inclusão de questões sobre ciência política e direitos humanos. A ideia é que a primeira prova de 2012 já seja renovada.
Está prevista a inclusão de conteúdos do chamado eixo de fundamentos do direito, que inclui filosofia e sociologia geral e jurídica, psicologia, antropologia, economia e ética geral e profissional. De acordo com o presidente do Conselho Federal da OAB, Ophir Cavalcante Júnior, a medida é uma resposta a críticas feitas à prova.

Resumo 24 - Formas de Governo

IV – Estado e Governo


7. Formas de Governo (Monarquia e República)


Introdução. Como já foi visto, embora haja divergências entre os autores, as denominações mais usuais e compatíveis com a Constituição brasileira em relação à tipologia de governos são:
regimes políticos: democracia e autocracia
formas de governo: monarquia e república
sistemas de governo: parlamentarismo e presidencialismo

Formas de governo. Conforme a tipologia acima, quando se fala em formas de governo trata-se da estrutura política do governo e da forma de acesso ao poder, especialmente no que se refere ao Poder Executivo. Segundo essa classificação, as formas de governo são Monarquia e República.

Monarquia

“Enforcai o último rei com as tripas do último padre” (DENIS DIDEROT, filósofo iluminista francês, 1713-1784)

Histórico. A Monarquia (do grego mono + arkê: autoridade única) é a forma mais tradicional de governo, utilizada desde a antiguidade. Segundo a classificação de Aristóteles, a monarquia, também chamada de realeza ou principado, é o governo de um só, que pode degenerar para tirania. Conforme Montesquieu, o princípio da Monarquia é a honra, ou seja, o rei deve honrar pessoas consideradas especiais com títulos e privilégios, reforçando a desigualdade, independentemente do mérito. É próprio da Monarquia, portanto, haver uma casta de privilegiados. O luxo e a ostentação são características normais tanto dos governantes como da sociedade numa monarquia. Os Estados modernos se constituíram como monarquias absolutistas, em que o poder se concentrava nas mãos do rei. Com as revoluções burguesas e o constitucionalismo, surgiram as monarquias constitucionais, nas quais o poder do rei é limitado e em sua maior parte é exercido de forma democrática e republicana.

Características da monarquia:
vitaliciedade: o poder não é exercido por tempo determinado, normalmente durando por toda a vida do rei.
hereditariedade: o poder é transmitido por sucessão hereditária, porque é propriedade da família real.
irresponsabilidade: o rei não responde por seus atos e nem deve prestar contas aos súditos.

Vantagens e desvantagens. Os defensores da Monarquia argumentam com sua estabilidade, distanciamento das lutas políticas e preparação especial do rei para o exercício do poder. Seus detratores argumentam que ela é essencialmente antidemocrática e que um Estado não pode ter sua sorte ligada a uma pessoa e sua família.

Monarquias Constitucionais. São Monarquias nas quais o poder do rei foi sendo diminuído até que lhe restou apenas o cargo quase simbólico de Chefe de Estado. Normalmente são combinadas com o sistema parlamentarista, com características republicanas, em que a Chefia de Governo é exercida por um primeiro-ministro eleito. É a única espécie de monarquia considerada compatível com a democracia. Ex: Inglaterra, Espanha, Dinamarca, Suécia etc.

República

“Nem um homem nesta terra é repúblico nem zela ou trata do bem comum, senão cada um do bem particular (...) verdadeiramente que nesta terra andam as coisas trocadas, porque toda ela não é república, sendo-o cada casa” (Frei Vicente do Salvador, 1564-1635).

Histórico. A República nasceu em Roma (509 a.C.) para combater a monarquia. Era o que os estudiosos denominavam governo misto, dividindo o poder entre o Consulado, o Senado e a plebe. Os dois cônsules dividiam o poder máximo, presidindo o Senado e comandando o exército (imperium) e eram eleitos anualmente. Havia ainda eleições para vários outros cargos, chamados de magistraturas, como edis, censores, questores, pretores e tribunos da plebe, cada um com funções específicas e exigência de idade mínima e experiência anterior em um cargo de menor importância (cursus honorum). Valorizava-se a moderação, a austeridade, o decoro e o respeito à coisa pública (res publica), que deveria estar acima dos interesses pessoais. O luxo e a ostentação eram vistos como negativos. Exemplo dessas virtudes foi cônsul Brutus, que mandou executar seus filhos por conspirarem contra a República. Séculos depois, Júlio César foi assassinado por senadores pelo mesmo motivo. Entre os assassinos, estava um descendente do mesmo Brutus, que era filho adotivo de César. Com a queda da República em Roma (27 a.C.), essa forma de governo praticamente desapareceu, até que passou a ser adotada por cidades italianas independentes no fim da Idade Média (Veneza, Florença etc.).

República moderna. O combate ao absolutismo monárquico identificou a República como uma forma mais democrática de governo, por limitar o poder, garantir a igualdade e propiciar a participação popular mediante a eleição de representantes. Os EUA já nasceram como República em 1776, e a Revolução Francesa implantou essa forma de governo em sua segunda fase (1792).

Características da república:
temporariedade: o poder deve ser exercido por tempo limitado, evitando-se mandatos longos e reeleições sucessivas;
eletividade: o acesso ao poder deve ser por eleição, e não por sucessão hereditária;
responsabilidade: os governantes devem responder por seus atos e prestar contas (transparência, accountability).

Princípio Republicano. Conforme a doutrina mais atual, as normas jurídicas se dividem em regras e princípios. Os princípios são mais abstratos do que as regras e estão acima delas, sendo baseados num conjunto de valores (por exemplo, o princípio da igualdade). Atualmente, entende-se que, mais do que uma forma de governo, a República é um princípio que abrange, além das características republicanas básicas, valores como a separação entre Igreja e Estado (Estado laico), ética na política, honestidade, respeito à coisa pública, impessoalidade, moderação, austeridade, combate aos privilégios, ao nepotismo e ao patrimonialismo (confusão entre o público e o privado), etc.

República x Democracia. Segundo o cientista político e filósofo Renato Janine Ribeiro, considerando que a Democracia é o regime em que se busca a conquista de direitos e a República é a forma de governo que exige sacrifícios em nome da coletividade, há uma tensão entre esses dois princípios, mas um não pode existir sem o outro. Para ele, “a República é o que nos faz respeitar o bem comum. A Democracia é o que nos faz construir uma sociedade da qual esperamos nosso bem. Na Democracia, desejamos ter e ser mais. Com a República, aprendemos a conter nossos desejos. Há uma tensão forte entre esses dois princípios, mas um não vive sem o outro” (...) “Não há política digna de seu nome, hoje, que não seja democrática e republicana. Mas há uma tensão entre esses dois ideais. A república é o regime no qual prevalece o bem comum, o que exige o sacrifício ou a contenção dos desejos e interesses privados. Já a força da democracia, hoje, e seu caráter popular estão justamente no fato de que ela mobiliza o desejo de ter mais – e sobretudo o desejo de ser mais”.

Para refletir. No Brasil, existem mais de 20 mil cargos públicos de livre nomeação pelos políticos. Nos EUA, são cerca de 10 mil e, na Inglaterra, menos de 200. A Inglaterra não seria, nesse ponto, mais republicana do que o Brasil?

Bibliografia

Leitura essencial:
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 121 a 125.

Leituras complementares:
ATALIBA, Geraldo. República e Constituição, ed. Malheiros.
RIBEIRO, Renato Janine. A República (coleção “Folha Explica”, ed. Publifolha).

sábado, 17 de setembro de 2011

Resumo 23 - Separação de Poderes


IV – Estado e Governo

6. Separação de Poderes



“Todo o poder corrompe: o poder absoluto corrompe absolutamente” (Lord Acton, 1887).


Introdução. Como já visto, o poder do Estado é uno, pois a soberania é indivisível. Esse poder, porém, pode ser concentrado ou distribuído por vários órgãos do Estado. Além disso, os estudiosos da política há muito tempo distinguiram três formas básicas pelas quais o poder do Estado se manifesta: a elaboração das leis, a execução das leis e o julgamento dos conflitos interpretando e aplicando as leis.

Poderes do Estado. O poder do Estado, portanto, atua de três modos básicos:
Legislação é a elaboração da lei (norma geral, abstrata e dotada de sanção).
Administração é a execução ou aplicação da lei por dever de ofício, sem necessidade de provocação.
Jurisdição é a aplicação da lei, de forma definitiva, nos conflitos de interesses, mediante a provocação de uma das partes.

Por exemplo: um imposto é sempre criado por uma lei (legislação); criado o imposto, o Estado vai cobrá-lo das pessoas (execução ou aplicação da lei no caso concreto); caso haja litígio entre o Estado e o contribuinte, essa lide será decidida por um órgão do Estado, que interpretará a lei e dirá quem tem razão (jurisdição).

“Separação de poderes”. A identificação dessas três formas básicas de atuação do Estado e, posteriormente, a utilização dessa distinção para a moderação do poder e garantia da liberdade deu origem à teoria chamada de “separação de poderes”. Note-se que essa teoria não visa dividir o poder, mas sim distribuir as diferentes funções para órgãos distintos do Estado.

Antecedentes históricos. Aristóteles (século IV a.C.) foi o pioneiro na identificação das três funções básicas do Estado, recomendando que fossem distribuídas em mãos diferentes para a boa organização da polis. Marsílio de Pádua (século XIV) afirmou que legislador deve ser o povo e não o monarca. Maquiavel (século XVI), afirmou a conveniência de o Príncipe ter juízes independentes. Segundo Locke (século XVIII), os poderes do Estado seriam quatro: Legislativo, Judiciário e o Executivo dividido em Prerrogativa (administração interna) e Poder Federativo (relações internacionais). Para ele, deveria haver supremacia do Legislativo, por este representar o povo.

Montesquieu. Charles-Louis de Secondat, barão de La Brède e de Montesquieu, foi um filósofo e jurista francês que viveu entre 1689 e 1755. Herdou o título de barão e o cargo de juiz do tribunal de Bodeaux de um tio, mas logo vendeu o cargo para se dedicar à filosofia. Levou mais de 20 anos para escrever sua obra máxima, O Espírito das Leis, publicado em 1748.

A teoria de Montesquieu. No Capítulo VI do Livro XI da obra, Montesquieu observa que existem três espécie de poder num Estado: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Porém, segundo ele, “é uma experiência eterna que todo homem que tem poder é levado a dele abusar. Vai até encontrar limites”. Para Montesquieu, não há liberdade se um poder está unido ao outro, e onde esses três Poderes estão concentrados nas mãos de uma pessoa ou de um único órgão, reina um “despotismo atroz”. A fórmula para limitar o poder é a distribuição dos três poderes para órgãos diferentes, a fim de que um limite o outro, evitando assim o abuso e garantindo a liberdade. Segundo suas palavras, “para formar um Governo moderado, precisa combinar os poderes, regrá-los, temperá-los, fazê-los agir; dar a um poder, por assim dizer, um lastro, para pô-lo em condições de resistir ao outro”.

Freios e contrapesos. Para Montesquieu, os poderes devem ser independentes e harmônicos, não devendo haver supremacia de um sobre outro. Assim, além da separação dos poderes ele aconselha que haja controles recíprocos, com um poder interferindo em alguns pontos no funcionamento do outro. Por exemplo, o Executivo poderia convocar o Legislativo e vetar leis aprovadas por este, consideradas inconvenientes. O Legislativo, por sua vez, poderia fiscalizar a execução das leis, exigindo que o Executivo preste contas. Posteriormente, essa teoria, que ficou conhecida como freios e contrapesos ou checks and balances, foi desenvolvida nos EUA a partir de 1787, onde foram implantados outros mecanismos, como controle de constitucionalidade e de legalidade pelo Judiciário, o impeachment do chefe do Executivo pelo Legislativo, a nomeação dos membros dos tribunais superiores pelo chefe do Executivo, etc.

Funções típicas e atípicas. Além dos freios e contrapesos, cada um dos três poderes tem funções típicas e atípicas, a fim de que possam funcionar adequadamente, mantendo a independência e a harmonia. O Legislativo tem como função típica a legislação e como funções atípicas a administração (funcionários próprios, material etc.) e jurisdição (julgamento do impeachment, julgamento disciplinar de seus membros). O Poder Executivo tem como função típica a administração e como funções atípicas a legislação (medidas provisórias, decretos, veto, iniciativa de lei) e jurisdição (processo administrativo). O Poder Judiciário tem como função típica a jurisdição e como funções atípicas a administração (funcionários próprios, material etc.) e legislação (iniciativa de lei).

Dogma do Constitucionalismo liberal. A partir das Constituições dos EUA (1787) e da França (1791), a teoria da separação dos poderes, com o fim de limitar o poder e assim garantir a liberdade, tornou-se um dogma do Constitucionalismo Liberal e foi incorporada na maioria das Constituições. Já no século XX, porém, ela passou a sofrer críticas, principalmente porque prejudicaria a eficiência do Estado. Atualmente, muitos autores afirmam que o dogma da separação de poderes estaria superado.

Função de controle. O eminente constitucionalista alemão Karl Loewenstein sustenta a existência de um Poder de Controle, que seria exercido pelo Ministério Público e pelo Legislativo, que tradicionalmente exerce a fiscalização do cumprimento das leis pelo Executivo, inclusive através do Tribunal de Contas. Podemos acrescentar que nesse contexto estaria também o controle externo do Judiciário e do Ministério Público e a imprensa livre, essencial para o controle do poder na democracia.

Para pensar. Você acha que o dogma liberal da separação de poderes está superado?

Bibliografia

Leitura essencial:
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 115 a 120.

Leituras complementares:
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política, Cap. 10.
MONTESQUIEU, Charles de. O espírito das leis, Livro XI, Cap. VI.
WEFFORT, Francisco (org.), Os clássicos da política, vol. 1, capítulo sobre Montesquieu.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Resumo 22 - Sistemas Eleitorais


IV – Estado e Governo

5. Sistemas Eleitorais



“A vontade do povo significa, na prática, a vontade do maior número ou da parte mais ativa do povo, da maioria ou daqueles que conseguem se fazer aceitos como a maioria; conseqüentemente, o povo pode desejar oprimir uma parte de seu número, e são necessárias tantas precauções contra isto como contra qualquer outro abuso do poder” (J. Stuart Mill, Sobre a Liberdade, 1859)


Introdução. Na democracia representativa, a escolha de representantes é feita pelo sufrágio (voto e candidatura). Há diversas formas de se organizar as eleições e contabilizar os votos, a fim de que a representação seja autêntica, isto é, corresponda o mais fielmente possível à vontade popular, pois esse é o objetivo da democracia. Os diversos modos pelos quais se organizam as eleições e se contabilizam os votos são sistemas eleitorais.

Definição. Conforme Jairo Nicolau, sistema eleitoral é o “conjunto de regras que define como, em uma determinada eleição, o eleitor pode fazer suas escolhas e como os votos são contabilizados para serem transformados em mandatos”. Em outras palavras, o sistema eleitoral determina “como se transformam votos em poder”.

Tipos de sistemas. Há diversos sistemas eleitorais, que podem ser utilizados de forma exclusiva ou combinada, como é mais comum. Os sistemas mais conhecidos são:
Majoritário
• Distrital
• Proporcional
• Distrital Misto


Sistema Majoritário. É o sistema mais simples: quem obtém mais votos é eleito (“first past the post”). Pode exigir maioria simples (maior número de votos entre os candidatos) ou maioria absoluta (mais da metade dos votos válidos). No sistema de maioria absoluta, caso não haja maioria de votos numa primeira votação faz-se um segundo turno entre os dois mais votados. O sistema majoritário (maioria simples ou absoluta, conforme o caso) é normalmente utilizado para a eleição do chefe do Executivo (presidente, governador e prefeito) e para senador. No sistema distrital, o sistema majoritário também é usado para a escolha de candidatos ao Legislativo (vereadores e deputados).

Conseqüências do Sistema Majoritário. Segundo os cientistas políticos, o sistema de maioria simples induz ao bipartidarismo e à formação de governos mais homogêneos, com maioria mais clara e programa mais definido. Os partidos pequenos tendem a enfraquecer ou desaparecer, porque não vêem vantagem em lançar candidatos próprios. Já o sistema de maioria absoluta (turno duplo, se necessário) favorece o pluripartidarismo e forma governos de coalizão, pois os partidos pequenos preferem lançar candidatos próprios no primeiro turno e deixar as coalizões para o segundo.

Sistema Distrital. Tradicionalmente, a representação política no Poder Legislativo era vinculada a comunidades regionais. Deputados e vereadores eram representantes da sua comunidade de origem, chamada “distrito”. Nesse sistema, para a eleição de representantes aos parlamentos municipais, estaduais ou federais, divide-se a circunscrição (cidade, estado ou país) em distritos, em número correspondente ao de vagas a serem preenchidas, e em cada distrito realiza-se uma mini-eleição pelo sistema majoritário. Normalmente, cada distrito elege apenas um representante por maioria simples. Esse sistema ainda é utilizado em muitos países, como Inglaterra, EUA etc., mas deixou de ser utilizado no Brasil.

Conseqüências do Sistema Distrital. Considerando que o sistema distrital é combinado com o sistema majoritário, ele produz as mesmas conseqüências desse sistema. Além disso, são citados como aspectos positivos do sistema distrital a aproximação entre o representante e o eleitor, facilitando a fiscalização por parte deste, e o barateamento das campanhas eleitorais, pois o candidato só faz campanha em seu distrito e não em toda a circunscrição. Isso tende a diminuir a corrupção, em grande parte causada pela necessidade de arrecadar somas cada vez maiores para campanhas cada vez mais caras. Por outro lado, são citados como aspectos potencialmente negativos do sistema distrital a facilitação do clientelismo, a possibilidade de formação de “currais eleitorais”, a sub-representação das minorias e a possibilidade de manipulação do desenho dos distritos para favorecer um determinado grupo político (gerrymandering).

Sistema Proporcional. Esse sistema foi criado na Bélgica, em 1900, sob a inspiração de Stuart Mill, com o intuito de possibilitar a representação de minorias e favorecer pluralismo no Poder Legislativo. A eleição é feita em toda a circunscrição e não por distritos. Basicamente, cada partido elege, para o Legislativo, número de representantes proporcional à votação obtida. Ex.: 20% dos votos = 20% das cadeiras; 10% dos votos = 10% das cadeiras e assim por diante. Com isso, um partido pequeno, que, por exemplo, tenha em média 10% dos votos, e que, portanto, dificilmente conseguiria eleger um representante num distrito, pelo sistema proporcional conseguiria ter 10% das cadeiras no Legislativo.

Cálculo da representação proporcional. Há diversas maneiras de se fazer esse cálculo. Segundo a lei brasileira (Código Eleitoral), divide-se o número de votos válidos pelo número de cadeiras a preencher, obtendo-se o quociente eleitoral (QE). O QE é o número mínimo de votos que um partido precisa obter para conquistar uma vaga. Em seguida, para se saber a quantas vagas o partido terá direito, divide-se a votação do partido pelo quociente eleitoral (QE), obtendo-se o quociente partidário (QP). Se houver sobras, as vagas restantes são preenchidas pelo sistema da maior média (repete-se a operação, adicionado-se 1 ao QE). Caso haja coligações de partidos, o cálculo do QP é feito com base nos votos da coligação.

Exemplo. Numa cidade com 100.000 votos válidos e 20 vagas para vereador, o QE é 5.000 (são precisos 5.000 votos para o partido conquistar uma cadeira na Câmara de Vereadores). Se o partido A obteve 20.000 votos, o Partido B teve 10.000 votos, o Partido C teve 5.000 votos e o Partido D teve 4.000 votos, a quantas cadeiras terá direito cada partido? Resposta: se o Partido A obteve 20.000 votos, seu QP é 4: terá direito a quatro cadeiras. Se o Partido B teve 10.000 votos, seu QP é 2: terá direito a duas cadeiras. Se o Partido C teve 5.000 votos, seu QP é um: terá direito a uma vaga. O Partido D não terá direito à representação, pois não atingiu o QE. As sobras serão repartidas entre os partidos que atingiram o QE.

Preenchimento das vagas no sistema proporcional. A partir do resultado da votação, se sabe quantas vagas cada partido conquistou. Para o preenchimento dessas vagas há dois sistemas: a lista aberta e a lista fechada. Pelo sistema de lista aberta (usado no Brasil), as vagas de cada partido são preenchidas pelos seus candidatos mais votados, por ordem de votação. Por exemplo, se o partido obteve quatro cadeiras, os quatro candidatos mais votados ocupam as vagas. Pelo sistema de lista fechada, o partido apresenta previamente uma lista, com a ordem de preferência dos candidatos, preenchendo as vagas conquistadas segundo essa ordem. Nesse caso, os quatro primeiros da lista pré-ordenada ocupam as vagas. A favor da lista aberta, argumenta-se que o eleitor pode escolher seu candidato preferido, mas isso traz a desvantagem de provocar competição dentro do próprio partido pela preferência dos eleitores, encarecendo ainda mais a campanha. Já na lista fechada, não há competição interna na campanha eleitoral e todos fazem campanha pelo partido, que sai fortalecido. Em contrapartida, os eleitores não podem influir na composição da lista, que é decidida pela direção do partido, nem sempre de forma democrática.

Conseqüências do Sistema Proporcional. O sistema proporcional gera o pluripartidarismo. Em seu favor, argumenta-se que ele possibilita a representação das minorias (que têm poucas chances pelo sistema majoritário), o que por sua vez favorece o pluralismo político. Isso, porém, traz o risco de multiplicação excessiva de partidos, com o surgimento dos chamados “partidos nanicos” e “legendas de aluguel”. Há, ainda, outros efeitos nefastos. Os candidatos de um partido com um “puxador de votos”, que infla o seu quociente partidário, podem ser eleitos com um número pequeno de votos, superando candidatos mais votados de outros partidos (“efeito Tiririca”). A campanha eleitoral fica ainda mais cara, pois todos fazem propaganda contra todos e numa área muito grande, o que, por sua vez, favorece a corrupção. Há, também, um distanciamento do eleitor, pois o representante, colhendo votos dispersos por uma grande área, não se sente vinculado a uma comunidade determinada.

Sistema Distrital Misto. Utilizado na Alemanha, esse sistema pretende unir as vantagens dos sistemas distrital e proporcional. Metade dos representantes é eleita pelo sistema distrital e metade pelo sistema proporcional. O eleitor dá dois votos: um no seu distrito e outro na circunscrição.

Sistemas adotados no Brasil. Atualmente no Brasil, para a chefia do Executivo (presidente da República, governador de Estado e prefeito) é utilizado o sistema majoritário. Exige-se maioria absoluta (segundo turno, se necessário), exceto para municípios com menos de 200 mil eleitores. Para o Senado, é utilizado o sistema majoritário (maioria simples). Para os Legislativos (Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas estaduais e Câmaras de Vereadores), é utilizado o sistema proporcional, com lista aberta.

Propostas de reforma. Há diversas propostas para uma reforma do sistema eleitoral brasileiro. Numa Comissão formada pelo Congresso Nacional, o relator do projeto, deputado Henrique Fontana (PT) propôs a adoção de um inédito sistema “proporcional misto”, em que metade dos componentes das casas legislativas seria eleita pelo sistema de lista aberta e metade por lista fechada. Por outro lado, há um movimento suprapartidário em favor do voto distrital: http://www.euvotodistrital.org.br/


Bibliografia

Leitura essencial


DALLARI, Dalmo. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, 101 a 103.

Leituras complementares

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política, Cap. 17.
NICOLAU, Jairo. Sistemas eleitorais, ed. FGV.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo, Título V, Cap. II, n. 18.

sábado, 3 de setembro de 2011

Resumo 21 - Sufrágio


IV – Estado e Governo

4. Sufrágio


“O voto não é, como pretendem muitos, um direito político, é mais do que isso, é uma fração da soberania nacional; é o cidadão" (José de Alencar - 1829-1877).


Introdução. Diversas são as formas de escolha de governantes: força física, sorteio, sucessão hereditária, voto etc. A democracia representativa, que prevalece no Estado Moderno, requer a escolha de representantes para governar em nome do povo. Essa escolha é feita através do sufrágio, que envolve o direito de votar e ser votado.

Definição. Sufrágio (do latim suffragium: escolher) é o direito público subjetivo de participar das decisões políticas, votando ou sendo votado. Faz parte dos direitos políticos do cidadão. É direito público subjetivo porque é um direito do cidadão exercido na esfera pública e para fins públicos. O direito de sufrágio envolve o sufrágio ativo (voto) e o sufrágio passivo (candidatura). É utilizado também para expressão da vontade popular na democracia semidireta (plebiscito e referendo).

Natureza. Discute-se se o sufrágio é apenas um direito ou é também uma obrigação. Na democracia, o sufrágio é fundamentalmente um direito, mas há opiniões no sentido de que, na sua forma ativa (voto), é também uma obrigação, daí o voto obrigatório adotado em alguns sistemas democráticos.

Voto obrigatório. O voto obrigatório deriva do entendimento de que, na democracia, existe a necessidade de se escolher representantes e de saber qual é a vontade do povo, o que se faz através do voto. Por isso, o voto, além de ser um direito, seria também uma função do cidadão, e, portanto, um dever, da mesma forma que serviço militar e o tribunal do júri.

Sufrágio universal. A democracia moderna se caracteriza pelo sufrágio universal, ou seja, pela extensão do direito ao sufrágio a todos os membros do povo que tiverem um mínimo de capacidade para fazer escolhas políticas, sem restrições discriminatórias ou injustificáveis. No passado, havia restrições hoje consideradas injustificáveis, como a proibição do sufrágio feminino, que só começou a ser abandonada no início do século XX, a partir de protestos das chamadas “sufragettes”. No Brasil, a primeira eleição que admitiu a presença de mulheres ocorreu em 1932, e ainda hoje há países que não admitem o sufrágio feminino, como a Arábia Saudita.

Restrições ao sufrágio. São consideradas justificáveis e, portanto, compatíveis com o sufrágio universal, desde que razoáveis, as seguintes restrições:
• nacionalidade
• idade
• condição mental
• condenação judicial (“ficha suja”)
• engajamento militar

São consideradas incompatíveis com o sufrágio universal as seguintes restrições:
• raciais (judeus na Alemanha nazista, negros no sul dos EUA até a década de 60)
• sexo
• condição econômica (sufrágio censitário)
• condição intelectual (sufrágio capacitário)

Modo de exercício. O sufrágio ativo (voto) pode ser:
aberto ou secreto, conforme deva ser exercido com publicidade ou em segredo (na democracia antiga, o voto era aberto, mas na democracia moderna o voto secreto é considerado uma garantia da liberdade do eleitor)
múltiplo ou igual, conforme tenha ou não valor igual para todos (“one man, ore vote”)
direto ou indireto, conforme tenha por destinatário o próprio candidato ao mandato ou um colégio eleitoral que vai escolher o mandatário

Voto direto e indireto. Nos EUA, o voto para presidente da República é indireto. Os eleitores de cada estado da federação elegem um número de delegados proporcional à população e que, por sua vez, vão compor o colégio eleitoral que vai escolher o presidente. Como o partido que obtém a maioria dos votos populares em cada estado tem direito a todos os delegados desse estado, desprezando-se os votos de quem votou contra o candidato vencedor, matematicamente pode acontecer de um presidente ter a maioria no colégio eleitoral mesmo tendo a minoria dos votos populares, e isso já aconteceu algumas vezes na história norte-americana. Mesmo assim, não há grande polêmica quanto ao caráter democrático das eleições norte-americanas. No Brasil, a ditadura militar imitou esse sistema para dar um verniz democrático às eleições, porém a composição do colégio eleitoral era manipulada para dar a vitória sempre ao partido governista (“casuísmos”), o que levou, em 1983, à campanha das “Diretas já”.

O sufrágio no Brasil. Na fase do Império, vigorava o sufrágio censitário, pelo qual o direito de votar e ser votado dependia da condição econômica do cidadão. Somente os mais ricos podiam se candidatar aos altos cargos. Na República Velha, o critério econômico foi abandonado em prol do sufrágio capacitário, impedindo-se o voto dos analfabetos, que eram a maioria da população. Além disso, predominavam o coronelismo, o clientelismo, o “voto de cabresto”, os “currais eleitorais”, as fraudes (eleição a “bico de pena”) etc. A Revolução de 1930 trouxe como uma de suas bandeiras a moralização do processo eleitoral, instituindo o título de eleitor, a cédula oficial, o voto secreto e organizando a Justiça Eleitoral (antes, eram os próprios políticos que organizava as eleições). Atualmente, vigora no Brasil o sufrágio universal, secreto, com valor igual, direto e com reduzidas possibilidades de fraude devido à urna eletrônica. Segundo a Constituição vigente, os direitos políticos começam a ser adquiridos aos 16 anos, completando-se aos 35, idade em que o brasileiro nato pode ser candidato a presidente da República.

As fraudes na Flórida. No capítulo 1 do livro Stupid white men, Michael Moore relata as fraudes ocorridas na eleição presidencial na Flórida em 2000. Foram impostas restrições arbitrárias ao sufrágio e criadas dificuldades para o voto que impediram milhares de eleitores pobres, negros e latinos de votar. Além disso, o sistema de votação era complexo e confuso, prejudicando ainda mais os eleitores mais humildes. Tais fraudes foram decisivas para a eleição de George W. Bush, que mesmo assim teve menos votos populares que Al Gore.

Para pensar. Há uma grande polêmica em torno da obrigatoriedade do voto. Brasil, Argentina e Chile, por exemplo, adotam a obrigatoriedade, enquanto nos EUA, na Alemanha e na Inglaterra, o voto é facultativo. Nos países onde o voto é facultativo, a média de comparecimento dos eleitores às urnas é apenas de 50%, o que, em democracias frágeis como a brasileira, pode levar dúvidas quanto à legitimidade popular do pleito. Argumenta-se que apenas os eleitores conscientes comparecem. Por outro lado, pode-se argumentar que os eleitores “encabrestados” por políticos inescrupulosos, pelo bolsa-família e por igrejas comparecerão de qualquer jeito, enquanto muitos eleitores conscientes preferirão ficar em casa, seja porque não acreditam no sistema, seja por comodidade. Você é favor ou contra o voto obrigatório?

Bibliografia

Leitura essencial:
DALLARI, Dalmo. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 97 a 100.

Leituras complementares:
NICOLAU, Jairo. História do voto no Brasil.
MOORE, Michael. Stupid white men, Cap. 1.

Filme: Mississipi em Chamas (Mississipi Burning, dir. Alan Parker, 1988)

sábado, 20 de agosto de 2011

Resumo 20 - Partidos Políticos

IV – Estado e Governo

3. Partidos Políticos


“Sem os partidos políticos não poderia funcionar o governo representativo, nem a ordem despontar do caos eleitoral” (James Bryce)

“O melhor partido é apenas uma espécie de conspiração contra o resto do país” (Lord Halifax)

Introdução. Os partidos políticos surgiram na democracia moderna, servindo como intermediários entre as diversas correntes de opinião da sociedade e o Estado e canalizando essas correntes para a representação política. Embora em declínio, eles ainda são os atores principais do sistema político, sendo a democracia representativa também chamada de “democracia de partidos”.

Histórico. É natural, na sociedade humana, a tendência à formação de grupos políticos rivais, como os democratas e oligarcas em Atenas, os defensores da plebe e os aristocratas do Senado em Roma, os guelfos (partidários do papa) e gibelinos (partidários do imperador) na Idade Média etc. Essa rivalidade freqüentemente extrapolava a arena política e degenerava em violência e guerra civil.

Combate às facções. Tradicionalmente, esses grupos rivais eram chamados de “facções” e considerados nocivos por dividirem a sociedade. Rousseau e os líderes da Revolução Francesa combateram as “sociedades parciais”, não admitindo a existência de “corpos intermediários” entre povo e a “vontade geral”. Em 1791 foi aprovada a Lei Le Chapelier, que proibia qualquer tipo de associação na França.

Aceitação dos partidos. Na Inglaterra, onde era tradicional a divisão dos grupos políticos entre tories (proprietários rurais, conservadores, apoiadores da Monarquia) e whigs (burgueses, liberais, apoiadores do Parlamento), os partidos começaram a ser aceitos no final do século XVIII, a partir dos escritos de Burke e da compreensão do papel da oposição.
Burke definiu o partido político como um “grupo de homens unidos para a promoção, através de seu esforço conjunto, do interesse nacional, com base em algum princípio determinado com o qual todos concordam”.

Ascensão dos partidos. No século XIX, com a massificação da política provocada pela extensão do sufrágio, os partidos foram assumindo lugar de destaque no sistema político, congregando as diferentes correntes de opinião da sociedade e servindo de intermediários entre a massa desorganizada de eleitores e o governo do Estado. Com isso, eles passaram a ser regulados pelo sistema jurídico, integrando até mesmo a Constituição de alguns Estados, como o Brasil.

Declínio dos partidos. Nas últimas décadas, os partidos têm sofrido um declínio em sua importância, pois não têm se mostrado eficientes para canalizar as reivindicações da sociedade contemporânea, sendo muitas vezes substituídos nessa tarefa por outros tipos de organização social, como as ONGs e as redes sociais da internet. Para isso contribuem a sua estrutura interna pouco democrática e o fato de se dedicarem exclusivamente ao jogo político e aos interesses de seus membros, deixando de constituir um canal de comunicação para a sociedade.

Crítica aos partidos. Segundo o teórico alemão Robert Michels (1876-1936), partidos políticos e sindicatos têm a tendência à formação de oligarquias internas, que passam a comandá-los segundo seus interesses pessoais. Segundo Michels, a oligarquização de partidos e sindicatos é uma “lei de ferro” sociológica.

Natureza. Para alguns teóricos, o partido político é uma realidade sociológica. Para outros, como Kelsen, é um órgão do Estado. Em alguns Estados, como a Alemanha, ele é considerado como pessoa jurídica de direito público; já em outros, como o Brasil, é considerado como pessoa jurídica de direito privado.

Conceito. Uma boa definição de partidos políticos é esta de Paulo Bonavides: “Organização de pessoas que, inspiradas por idéias ou movidas por interesses, buscam tomar o poder, normalmente por meios legais, e nele conservar-se para a realização dos fins propugnados”.


Classificações. Há várias classificações relativas aos partidos políticos, segundo autores como Max Weber, Giovanni Sartori, Angelo Panebianco, Norberto Bobbio e Maurice Duverger. Utilizaremos como base a deste último, com algumas contribuições dos outros.

Quanto à organização interna. Quanto à organização interna, ou seja, com relação ao seu funcionamento e o tipo de filiados que o compõem, Duverger classifica os partidos em:
partidos de quadros: mais preocupados com a qualidade do que com a quantidade de membros e são financiados por grandes contribuintes, não necessariamente filiados (ex.: partidos Republicano e Democrata nos EUA e o PSDB no Brasil)
partidos de massas: nascem para representar as massas trabalhadoras, buscam o maior número possível de adeptos e são financiados por contribuições dos filiados (ex.: o Partido Trabalhista inglês e o PT no Brasil)

Partido “pega-tudo”. Segundo a doutrina mais atual, essa classificação está superada, pois, com a profissionalização da classe política e a oligarquização dos partidos, tanto os partidos de quadros como os de massas tendem a se transformar no que se chamou de partidos eleitorais de massa ou partidos “pega-tudo”, flexibilizando seus programas e dirigindo-se mais aos eleitores em geral do que aos seus filiados ou a uma classe social específica.


Quanto à organização externa. Essa classificação diz respeito ao número de partidos que existem ou podem existir num Estado:
Partido único: sistema próprio do totalitarismo, que só admite um partido e não admite divisões políticas. Ex.: nazi-fascismo, URSS e Cuba.
Bipartidarismo: sistema em que dois grandes partidos predominam em razão do sistema eleitoral, sem proibir a existência de outros. Ex.: Inglaterra e EUA.
Pluripartidarismo: sistema em que mais de dois partidos predominam e têm chances de chegar ao poder, podendo levar à extrema dispersão e à necessidade de imposição de limites, que são as “cláusulas de barreira”. Ex.: Brasil e Alemanha.

Quanto ao âmbito de atuação. Segundo essa classificação os partidos são:
Partidos de vocação universal ou internacional: extrapolam os limites dos Estados. Ex.: o antigo PC da URSS.
Partidos nacionais: atuam nos limites do território do Estado, sem se restringir a uma região. É o único tipo permitido atualmente no Brasil.
Partidos regionais: atuam em determinadas regiões de um Estado. Ex.: os partidos estaduais da República Velha.
Partidos locais: atuam apenas nas cidades. Não existem exemplos dignos de nota.

Quanto à ideologia. Essa classificação é baseada em Norberto Bobbio, que em obra recente defende a validade, ainda hoje, da dicotomia entre direita e esquerda, que para alguns estaria superada. Essa divisão tem origem na Revolução Francesa, quando a Assembléia Nacional dividiu-se entre os jacobinos (radicais, defensores da igualdade, que se sentavam à esquerda do salão) e girondinos (moderados, defensores da liberdade e que se localizavam à direita). Para Bobbio, o critério de distinção entre os dois pólos é a postura diante da igualdade.

Esquerda. Preocupação com a igualdade real. Reivindica justiça social por meio de maior intervenção do Estado. Prega a predominância do coletivo, mesmo que isso prejudique a liberdade individual. A centro-esquerda (social-democracia) atua segundo as regras do jogo democrático. A extrema-esquerda despreza a democracia e aceita métodos violentos e governo totalitário para atingir suas finalidades (Ex.: URSS, Cuba, FARCs, MST etc.).

Direita. Valoriza a liberdade individual e a igualdade formal (perante a lei). Condena a intervenção do Estado na economia e na sociedade. As desigualdades sociais seriam naturais e o progresso do indivíduo deve depender do próprio esforço. A centro-direita (direita liberal) aceita as regras do jogo democrático. A extrema-direita despreza a democracia e prega superioridade de um grupo sobre outros (nacionalismo xenófobo, racismo etc.), usando milícias e métodos violentos para a imposição da ideologia (Ex.: nazi-fascismo, Ku Klux Klan, neonazistas etc.).

Partidos políticos no Brasil. Os partidos políticos surgiram no Brasil durante o reinado de D. Pedro II, dividindo-se entre conservadores e liberais. Durante a República Velha predominaram os partidos de âmbito estadual (PRP etc.). Entre 1946 e 1965, predominaram o PSD (centro), PTB (centro-esquerda) e a UDN (centro-direita). Durante a ditadura militar, só foram permitidos dois partidos, a ARENA (apoio à ditadura) e o MDB (oposição consentida). Com a redemocratização, surgiram: PDS (ex-ARENA, atual PP), PMDB (ex-MDB), PFL (dissidência do PDS) e outros. Atualmente, temos DEM (ex-PFL, dissidência do antigo PDS), PT (intelectuais de esquerda e sindicalistas), PSDB (dissidência do PMDB), PDT (herdeiro do PTB getulista), PPS (ex-PCB), PC do B (dissidência do antigo PCB), PSOL (dissidência do PT), PV etc.

Outras formas de representação. No século XX foram tentadas outras formas de representação política, como a profissional, a corporativa (usada parcialmente no Brasil em 1934), a institucional etc., porém elas não foram capazes de substituir a representação por meio dos partidos.

Para pensar. Ainda seria válida atualmente a dicotomia entre direita e esquerda? Em caso positivo, você é de direita ou de esquerda?

Bibliografia

Leitura essencial
:
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 84 a 87.

Leituras complementares:
BOBBIO, Norberto. Direita e Esquerda.
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política, Caps. 19 (item 5), 23, 24 e 25.
DIAS, Reinaldo. Ciência Política.
DUVERGER, Maurice. Os partidos políticos (ed. UNB).
SCHIMITT, Rogério. Partidos políticos no Brasil.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Resumo 19 - Democracia representativa e semidireta

IV – Estado e Governo

2. Democracia direta, representativa e semidireta


“Nenhum homem é bom o bastante para governar a outro sem o seu consentimento" (Abraham Lincoln)


Introdução. Já vimos que democracia é o regime de governo em que prevalece a vontade do povo. Essa vontade pode ser expressa diretamente, como ocorria nas democracias antigas, ou por meio de representantes, como é mais freqüente nas democracias modernas. Também é possível a combinação da vontade popular com a intermediação de representantes.

Formas de Democracia. Conforme a forma da participação popular nas decisões mais relevantes do governo de um Estado, podemos classificar as formas de democracia como direta, semidireta e representativa. Essas formas de democracia podem ser praticadas de forma isolada ou cumulativamente.

Democracia direta. Democracia direta era a forma de democracia praticada na Grécia antiga, especialmente em Atenas, onde o povo debatia e decidia as questões mais importantes da polis em assembléias realizadas em praça pública, sem a intermediação de representantes. Hoje esse tipo de democracia só é praticado em pequenos cantões (estados federados) suíços (Landsgemeinde) e ainda assim de forma restrita, porque os assuntos não são amplamente discutidos, havendo uma preparação prévia pelas autoridades. Rousseau era um admirador da democracia direta, tendo escrito: “É nula toda lei que o povo diretamente não ratificar e, em absoluto, não é lei. O povo inglês pensa ser livre e muito se engana, pois o é somente durante a eleição dos membros do parlamento; logo que estes são eleitos, ele é escravo, não é nada. Durante os breves momentos de sua liberdade, o uso que dela faz, mostra que bem merece perdê-la” (Do contrato social, 1765).

Democracia Representativa. Devido à impossibilidade da reunião de um grande número de pessoas para a tomada de decisões e à desconfiança quanto à capacidade do povo de tomar decisões de governo, a democracia no Estado Moderno é predominantemente representativa, ou seja, o povo elege representantes para tomar as decisões em seu lugar. Prevaleceu, na democracia moderna, a opinião de Montesquieu, que escreveu: “O povo é admirável para escolher aqueles a quem deve confiar parte de sua autoridade (...) Mas saberá ele conduzir um assunto, conhecer os lugares, ocasiões e momentos mais favoráveis para resolvê-lo? Não: não saberá.” (Montesquieu, O espírito das leis, 1748).

John Stuart Mill (1806-1873). Filósofo e teórico da política inglês, escreveu várias obras famosas, dentre as quais uma sobre o governo representativo. Segundo ele: “O único governo que pode satisfazer plenamente todas as exigências do Estado social é aquele no qual todo o povo participa; que toda a participação, mesmo na menor das funções públicas, é útil; que a participação deverá ser, em toda parte, tão ampla quanto o permitir o grau geral de desenvolvimento da comunidade; e que não se pode, em última instância, aspirar por nada menor do que a admissão de todos a uma parte do poder soberano do Estado. Mas como, nas comunidades que excedem as proporções de um pequeno vilarejo, é impossível a participação pessoal de todos, a não ser uma parcela muito pequena dos negócios públicos, o tipo ideal de um governo perfeito só pode ser o representativo.” (O governo representativo, 1861).

Representação Política. A representação política pressupõe a escolha de representantes, aos quais é conferido um mandato. O mandato político foi inspirado no contrato de mandato do Direito Civil, através do qual uma pessoa nomeia outra para representá-la num ato jurídico.

Mandato imperativo. De início, o mandato político era imperativo, ou seja, havia vinculação do representante às instruções dos representados, que poderiam revogar o mandato caso houvesse desobediência ou infidelidade. Na França, por exemplo, essas instruções se chamavam cahiers de dolèance (cadernos de queixas).

Mandato livre. A partir da Revolução Francesa e dos escritos de Edmund Burke (1729-1797) na Inglaterra, o titular de mandato passa a ser visto como representante de todo o povo e não apenas dos seus eleitores, surgindo o mandato livre, pelo qual o representante não se vincula às instruções de seus eleitores. Segundo Burke: “O Parlamento não é um congresso de embaixadores que defendem interesses distintos e hostis, interesses que cada um de seus membros deve sustentar, como agente e advogado, contra outros agentes e advogados, mas uma assembléia deliberativa de uma nação, com um interesse: o da totalidade, onde o que deve valer não são os interesses e preconceitos locais, mas o bem geral que resulta da razão geral do todo. Elegei um deputado, mas quando o haveis escolhido, ele não é o deputado por Bristol, e sim um membro do parlamento.” (“Discurso aos eleitores de Bristol”, 1774).

Características do Mandato Político. Atualmente, o mandato político é livre (não vinculado), geral (para qualquer assunto de competência do representante), autônomo (os atos do representante não dependem de confirmação), irresponsável (o representante não deve explicações por suas decisões) e irrevogável (com exceção do recall, que não existe no Brasil).

Democracia semidireta. A democracia semidireta é um meio-termo entre a democracia direta e a representativa. Nesse tipo de democracia o povo participa da tomada de decisões políticas, propondo, aprovando ou autorizando a elaboração de uma lei ou a tomada de uma decisão relevante pelo Estado. A atuação do povo, porém, não é exclusiva, pois ele age em conjunto com os representantes eleitos, que por sua vez vão elaborar, discutir ou aprovar a lei, conforme o instrumento de democracia semidireta que está sendo utilizado. É utilizada atualmente em combinação com a democracia representativa, que ainda prevalece. Muito usada em países como EUA e Itália, é rara no Brasil, que só a utilizou em 1963, 1993 e 2005 e em quatro leis de iniciativa popular.

Instrumentos da democracia semidireta. São instrumentos da democracia semidireta:
• plebiscito
• referendo
• iniciativa popular
• veto popular
recall

Plebiscito. Plebiscito (do latim plebiscitum: decreto da plebe) é uma consulta ao povo pelo qual este aprova ou não a elaboração ou a modificação futura de uma lei, uma emenda constitucional ou uma decisão governamental. Se houver aprovação, cabe ao poder competente a elaboração da medida. É importante notar que ele é anterior à lei ou à decisão governamental, que só serão elaboradas se houver aprovação popular. Exemplo: o plebiscito de 1993 sobre forma e sistema de governo. Caso fosse aprovada pelo povo a implantação da monarquia e/ou do parlamentarismo, a regulamentação caberia aos deputados e senadores, por meio de emenda à Constituição. É também por meio de plebiscito que se decide a criação de novos municípios e estados da Federação, como está sendo proposto em relação ao Pará.

Referendo. Referendo (do latim referendum: aprovação) é uma consulta feita ao povo sobre uma lei, emenda constitucional ou decisão governamental já elaborada pelo poder competente, mas ainda não vigente. Se houver aprovação, a medida entra em vigor. Note-se que o referendo é posterior à elaboração da medida pelos representantes. Exemplo: o referendo de 2005 sobre o desarmamento. Neste caso, a proibição da fabricação e da venda de armas já constava da lei, porém a sua vigência dependia da aprovação popular, o que não ocorreu.

Iniciativa popular. Na democracia representativa, o processo de elaboração de uma lei é iniciado por um projeto apresentado por um representante (membro do Poder Legislativo, chefe do Poder Executivo e do Judiciário, conforme o caso). A iniciativa popular é um instrumento de democracia semidireta que permite que o processo legislativo seja iniciado pelo do povo. Exige-se que um número relevante de eleitores (1% do eleitorado, no Brasil) assine o projeto. A partir daí, o processo legislativo segue seu trâmite normal, com discussão e deliberação pelo Poder Legislativo e veto sou sanção pelo Poder Executivo. Ex.: a Lei da Ficha Limpa.

Veto Popular. É um instrumento da democracia semidireta por meio do qual o povo pode vetar uma lei já aprovada ou revogar uma decisão judicial. Não existe no Brasil, sendo utilizado em alguns estados norte-americanos.

Recall. O recall é a revogação do mandato político pelo povo. Colhendo-se um número de assinaturas determinado pela Constituição ou pela lei, convoca-se um recall, através do qual o eleitorado decide se um mandatário deve ou não ter o seu mandato cassado. Também não existe no Brasil, sendo utilizado em alguns estados norte-americanos. Exemplo: na Califórnia, em 2003, o povo revogou o mandato do governador Gray Davis, considerado inepto, e elegeu Arnold Schwarzenegger. Há proposta para implantá-lo no Brasil, com o sugestivo nome de “Lei da Justa Causa”.

Deturpação da democracia semidireta. Embora sejam meios de aumentar a participação do povo em decisões importantes de governo, os instrumentos da democracia semidireta podem ser utilizados para legitimar medidas antidemocráticas, o que se faz mediante a manipulação da opinião pública com propaganda maciça e a intimidação da oposição, da imprensa e dos eleitores. É a clássica utilização de instrumentos da democracia para destruir a democracia. Exemplos: cesarismo, bonapartismo, nazismo e chavismo. Por isso é importante sempre lembrar esta lição: "É o eterno destino do indolente ver seus direitos se tornarem uma presa para o esperto. A condição sob a qual Deus deu a liberdade ao homem é a eterna vigilância" (Mr. T.P. Curran, Middle Temple, 1790).

Para pensar. Atualmente, com ampliação do acesso à internet, seria interessante a utilização pelos governos desse instrumento para a consulta popular, ampliando, assim, a participação do povo nas decisões políticas?

Bibliografia

Leitura essencial
:
DALLARI, Dalmo de Abreu, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 79 a 83.

Leituras complementares:
WEFFORT, Francisco (org.), Os clássicos da política, vol. 2, capítulos sobre Burke e Stuart Mill.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Resumo 18 - Regimes de Governo

IV – Estado e Governo

1. Regimes de Governo: Democracia e Autocracia


Introdução. A partir deste capítulo estudaremos os regimes (democracia e autocracia), as formas (república e monarquia) e os sistemas (parlamentarismo e presidencialismo) de governo, que, basicamente, caracterizam o modo de acesso, distribuição e exercício poder num Estado.

Teorias clássicas sobre os tipos de governo. Ao longo da história, muitos filósofos e teóricos da política elaboraram classificações dos tipos de governo. Destacaremos a seguir as classificações mais importantes.

Platão (428-347 a.C.). Na República, Platão descreveu dois tipos ideais de governo (monarquia e aristocracia, governo de um ou de poucos, treinados conforme os conselhos do filósofo) e quatro tipos reais, todos corrompidos, cada um baseado num princípio e que se sucedem em ordem decrescente: timocracia (honra), oligarquia (riqueza), democracia (liberdade excessiva, licenciosidade) e tirania (violência).

Aristóteles (384-322 a.C.). Baseado na observação dos Estados de sua época, Aristóteles classificou os governos segundo o número de governantes e o modo de exercício do poder. Para ele, as formas boas de governo são as exercidas em benefício do bem comum, e as formas más ou degeneradas são as exercidas para favorecer apenas aqueles que governam.
a) governo de um:
Monarquia (forma boa): apenas um exerce o poder, mas em favor do bem comum
Tirania (forma má): poder exercido por um tirano em seu próprio interesse
b) governo de poucos:
Aristocracia (forma boa): governo dos virtuosos (aristói, aqueles que têm aretê ou virtude)
Oligarquia (forma má): voltada para o bem dos poucos (olígos) que governam
c) governo de muitos:
Politeia (forma boa, que significa “constituição”): governo de muitos, exercido no sentido do bem comum
Democracia (forma degenerada): governo de muitos dominado pelos demagogos e exercido no interesse dos pobres contra os ricos

Importante observar que tanto para Platão como para Aristóteles a democracia era uma forma degenerada de governo, porque eles se baseavam no que ocorria em Atenas na sua época. Esse sentido mudou com o tempo e a democracia passou a ser considerada o melhor regime de governo, qualificando-se como demagogia ou oclocracia a degeneração da democracia.

Cícero (106-46 a.C.). Filósofo, senador e advogado romano, Marco Túlio Cícero utilizou a classificação de Aristóteles, porém pregava um governo misto, como era a República romana, na qual se combinavam a monarquia (Consulado), a aristocracia (Senado) e a democracia (Assembléia Popular), equilibrando e moderando o poder.

Políbio (203-120 a.C.) e Maquiavel (1469-1527). Políbio e Maquiavel adotaram a teoria dos ciclos, segundo a qual os governos sempre passam pelos seguintes ciclos: monarquia, tirania, aristocracia, oligarquia, democracia e oclocracia (governo desorganizado da multidão). Eles divergem sobre o que ocorre partir da oclocracia. Para Políbio, retorna-se à monarquia, reiniciando-se o ciclo, já para Maquiavel o Estado se dissolve e é dominando por outro.

Montesquieu (1869-1755). Em O espírito das leis, Montesquieu identificou três formas de governo, cada uma com sua natureza (modo de ser) e seu princípio (o que a faz funcionar), sendo cada uma delas adequada às características de um país.
a) República. Natureza: governo popular, podendo ser o governo de muitos (democracia) ou o governo de poucos (aristocracia). Princípio: virtude política ou patriotismo. Própria de Estados pequenos.
b) Monarquia. Natureza: governo de um só, mas com leis fixas e estabelecidas. Princípio: honra. Própria de Estados médios.
c) Despotismo. Natureza: governo de um só, segundo a vontade do déspota. Princípio: medo. Próprio de Estados grandes.

Classificação atual. Há muita confusão entre os autores quando se fala de regimes, formas e sistemas de governo. Utilizaremos neste curso a seguinte classificação, que é mais atual e está de acordo com a Constituição brasileira:
regimes de governo: democracia e autocracia formas de governo: monarquia e república sistemas de governo: parlamentarismo e presidencialismo


Regimes de Governo. O poder soberano do Estado é exercido através do governo, abrangendo este os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Segundo a nossa classificação, os regimes de governo são democracia e autocracia, conforme o governo seja mais ou menos autoritário, haja mais ou menos liberdade e participação popular etc.


1.1. Democracia

“A democracia está em toda parte, a democracia não existe em parte alguma” (Manoel Gonçalves Ferreira Filho)

Introdução. A Democracia (do grego demos: povo, kratos: poder) teve origem na Grécia antiga e foi definida por Abraham Lincoln como o governo do povo, pelo povo e para o povo. Ou seja, a Democracia é o regime em que o poder pertence ao povo, é exercido pelo povo e em benefício do povo.

“Nós aqui presentes solenemente afirmamos que esses homens não morreram em vão, que esta nação, com a graça de Deus, verá o nascimento de uma nova Liberdade, e que o governo do povo, pelo povo e para o povo jamais desaparecerá da face da terra” (Lincoln, Discurso de Gettysburg, 1863).

Democracia Antiga. Democracia era o regime de governo das cidades-Estado gregas, especialmente Atenas, por volta de V e IV a. C. Possuía as seguintes características básicas:
• exercício direto do poder pelo povo (decisões políticas tomadas em assembléias na praça pública)
• alto grau de participação dos cidadãos
• conceito restrito de cidadania (exclusão de jovens, mulheres, escravos e às vezes dos pobres)
• liberdade política com limitação da liberdade individual
isagoria (direito à palavra nas assembléias), isonomia (igualdade perante a lei) e isotimia (igualdade no acesso aos cargos públicos)
• cargos públicos preenchidos preferencialmente por sorteio e exercidos por tempo limitado

Discurso de Péricles

Nosso regime político é a democracia e assim se chama porque busca a utilidade do maior número e não a vantagem de alguns. Todos somos iguais perante a lei, e quando a cidade outorga honraria o faz para recompensar virtudes e não para consagrar privilégios.

O governo favorece a maioria em vez de poucos – por isso é chamado de democracia. Se consultarmos a lei, veremos que ela garante justiça igual para todos em suas diferenças; quanto à condição social, o avanço na vida pública depende da reputação de capacidade. As questões de classe não têm permissão de interferir no mérito, tampouco a pobreza constitui um empecilho: se um homem está apto a servir ao estado, não será tolhido pela obscuridade da sua condição.

Cultivamos o refinamento sem extravagância, e o conhecimento sem afetação. Empregamos a riqueza mais para o uso do que para a exibição e situamos a desgraça real da pobreza não no reconhecimento do fato, mas na recusa de combatê-la.

Diferentemente de qualquer outra comunidade, nós, atenienses, consideramos aquele que não participa de seus deveres cívicos não como desprovido de ambição, mas sim como inútil.

Em vez de considerarmos a discussão como uma pedra no caminho da ação, a consideramos como uma preliminar indispensável de qualquer ação sábia. Em resumo, afirmo que, como cidade, somos a escola de toda a Grécia...
(Discurso em homenagem aos atenienses mortos na guerra do Peloponeso, 430 a. C.)

Democracia Moderna. Desaparecida na Grécia, a democracia só ressurgiu no Estado Moderno, a partir das revoluções burguesas e do constitucionalismo, como parte da luta contra o absolutismo e pela afirmação dos direitos naturais. A democracia moderna, porém, se diferencia da antiga pela extensão da cidadania (busca do sufrágio universal) e pela limitação da participação direta (democracia representativa).

Rousseau. A maior contribuição teórica para a democracia moderna foi dada por Rousseau, que em sua obra O contrato social (1762) afirmou que a soberania pertence ao povo e a lei deve ser expressão da vontade geral. Para Rousseau, todos os seres humanos são livres e iguais por natureza, e, para que continuem assim ao passar a viver em sociedade, é necessário formular um contrato social pelo qual ninguém esteja submetido a outrem, mas sim todos subordinados a todos. Com isso, todos seriam ao mesmo tempo sujeitos (soberanos) e objetos (súditos) do poder, permanecendo assim tão livres e iguais como no estado natural. Na democracia que idealizou, Rousseau não aceitava que a vontade dos cidadãos fosse representada, nem que houvesse corpos intermediários (associações) ou sociedades parciais (partidos políticos) entre o governo e o povo.

“Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja, com a toda a força comum, a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo, permanecendo assim tão livre quanto antes. É esse o problema fundamental ao qual o Contrato Social dá a solução” (Rousseau)


“A Democracia na América”. Este é o título de um livro clássico do filósofo francês Alexis de Tocqueville, que, em vista aos EUA em 1831, ficou impressionado com o funcionamento da democracia norte-americana, caracterizada pela intensa participação dos cidadãos, pela igualdade de oportunidades e pela prevalência da soberania popular mediante eleições livres. Para ele, a democracia política, social e econômica ali vigente era o futuro da humanidade. Ficou famosa sua observação de que os males da democracia devem ser resolvidos com mais democracia e não com restrições às instituições democráticas.

Século XIX. No século XIX prevaleceu a democracia liberal, caracterizada pela garantia das liberdades públicas e da igualdade formal (perante a lei). A participação popular era limitada à eleição de representantes e o sufrágio (direito de votar e ser votado) era restrito em razão da renda (voto censitário), da escolaridade (a maioria da população era analfabeta) e do sexo (proibição do sufrágio feminino). Somente aos poucos e apenas em alguns países, como Inglaterra, EUA e França, é que essa democracia foi se transformando em democracia de massas, com a extensão do sufrágio à maior parte da população.

Século XX. O início do século XX foi marcado pelo desprestígio da democracia liberal, que sofria ataques tanto dos socialistas como dos fascistas. Os socialistas criticavam a democracia formal, que não garantia a participação popular e a igualdade real. Os fascistas criticavam a fraqueza dos governos democráticos para tomar decisões essenciais ao Estado e dar força à nação. Ambos pregavam as virtudes da ditadura, seja do proletariado, seja do líder carismático (duce ou führer).

Pós-guerra. A democracia só recuperou seu prestígio após o fim da II Guerra Mundial, mas agora com exigência de ampla participação popular e garantia dos direitos civis, políticos e sociais. Atualmente, nenhum Estado, mesmo os totalitários como Coréia do Norte e Cuba, admite ser antidemocrático. O problema, portanto, é como identificar uma democracia, ou, antes, saber se a democracia existe de fato ou não.

A democracia existe? Para Rousseau, não existe e talvez nunca existirá uma democracia perfeita, a não ser para “um povo de deuses”. De fato, parece impossível, exceto num Estado ideal, que todas as leis sejam expressões da vontade geral e que o governo aja sempre de acordo com essa vontade. O que existe são Estados onde isso ocorre com mais ou com menos intensidade, ou seja, existem Estados mais e menos democráticos, além, é claro, de Estados não democráticos, que são as autocracias. O que se deve buscar, portanto, como escreve Manoel Gonçalves Ferreira Filho, é a democracia possível.

Poliarquia. Atento ao fato de que não existe uma democracia perfeita, o cientista político norte-americano Robert A. Dahl, em obra publicada em 1972, propôs que, em lugar de democracia, fosse utilizada a qualificação de poliarquia para os Estados onde houvesse, ao mesmo tempo, um grau razoável de participação popular e de competição pelo poder (oposição). Para que haja uma poliarquia não basta a ocorrência isolada de um dos fatores, ou seja, não basta haver alto grau de participação popular sem possibilidade de oposição (como em Cuba, na Síria e no Irã), como também não basta haver competição pelo poder (oposição) se o povo não pode participar da vida política (ex.: a República Velha no Brasil). Embora a obra de Dahl seja muito influente, o termo poliarquia não substituiu a tradicional democracia, sendo usado apenas por estudiosos da Ciência Política.

A democracia segundo Dallari. Segundo Dallari, para que um Estado seja considerado democrático, ele deve preencher os seguintes requisitos:
supremacia da vontade popular: eleições livres e periódicas; sufrágio universal; outras formas de participação popular, como plebiscito, referendo, iniciativa popular e orçamento participativo; prestação de contas, transparência etc.
preservação da liberdade: limitação do poder; liberdade de imprensa, de expressão, de associação e outras liberdades públicas; oposição; respeito às minorias etc.
igualdade de direitos: garantia de acesso livre e igualitário aos direitos políticos, civis e sociais.

Democracia como técnica e como valor. Segundo o filósofo italiano Norberto Bobbio (1909-2004), a democracia é ao mesmo tempo técnica e valor. Como técnica, ou seja, sob o ponto de vista formal, ela é definida como “regras de procedimento para a formação de decisões coletivas, em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados”. Bobbio ensina que “apenas onde essas regras são respeitadas o adversário não é mais um inimigo (que deve ser destruído), mas um opositor que amanhã poderá ocupar o nosso lugar”. Sob esse ponto de vista, a vontade da maioria deve prevalecer, porém com respeito às regras do jogo democrático, ou seja, não se pode usar a democracia para destruir a democracia. Ainda segundo Bobbio, a democracia é também um valor, isto é, um conjunto de fins (e não apenas de meios), dentre os quais sobressaem a liberdade e a igualdade jurídica, social e econômica.

Democracia como ethos. Na mesma linha de ver a democracia como um valor e não apenas como uma técnica de escolha de governantes, o cientista político brasileiro Renato Janine Ribeiro escreve que a democracia deve orientar nossas condutas morais, afetivas, sociais e comportamentais (ethos).

“Democracia não é só a escolha por votos, mas é o casal ter um diálogo bom e respeitoso, o patrão ouvir os empregados e aceitar suas sugestões, o professor ou o pai escutar o aluno ou o filho e não ter vergonha de pedir desculpas. Democracia, aqui, significa um concentrado de atitudes, em que se incluem a conversa limpa, honesta e sincera, a renúncia a ser o dono da verdade e, finalmente, as boas maneiras. Ser educado pode ser um traço essencial da democracia, porque é um modo de dizer que o outro vale tanto quanto nós” (Renato Janine Ribeiro).


Para pensar sobre a democracia

"Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos" (Churchill)

“Em matéria de desonestidade, a diferença entre o regime democrático e a ditadura é a mesma que separa a ferida que corrói a carne por fora e o tumor invisível que corrói por dentro. As feridas democráticas curam-se pelo sol da publicidade, com o cautério da opinião pública livre; ao passo que os cânceres profundos da ditadura apodrecem internamente o corpo social e são por isso mesmo muito mais graves” (Clemenceau)

“Nenhuma guerra explodiu até agora entre Estados dirigidos por regimes democráticos. O que não quer dizer que os Estados democráticos não tenham feito guerras, mas apenas que jamais fizeram entre si” (Norberto Bobbio)


1.2. Autocracia

“Quando me perguntam se uma nação está madura para ser livre, respondo: existe um homem maduro para ser déspota?” (Lord John Russel).

“O despotismo se apresenta freqüentemente como o reparador de todos os males sofridos; é o apoio da razão, o sustentáculo dos oprimidos e o instaurador da ordem. Os povos adormecem no seio da prosperidade momentânea que ele propicia; e, quando despertam, estão na miséria. A liberdade, ao contrário, comumente nasce no meio das tempestades, estabelece-se penosamente entre as discórdias civis e não é senão quando já está velha que se pode conhecer seus benefícios” (A. Tocqueville).



Introdução. Autocracia é a denominação mais atual para o regime político que se contrapõe à democracia. Também se fala em ditadura, tirania, despotismo, absolutismo e totalitarismo, porém cada um desses conceitos tem características próprias e são todos abrangidos pelo termo mais genérico autocracia. Autocracia significa governar por si próprio (auto + kratos ), servindo para designar todos os regimes de tipo autoritário. Segundo o autor alemão Karl Loewenstein, a autocracia se caracteriza pela existência, num Estado, de uma pessoa ou um pequeno grupo de pessoas como “único detentor do poder, cuja competência abarca a função de tomar a decisão política fundamental, assim como sua execução, e que ademais está livre de qualquer controle eficaz”.

Histórico. Loewenstein observa que durante a maior parte da história os povos viveram sob autocracias, como, por exemplo, os antigos impérios teocráticos, o império romano e as monarquias absolutistas do Estado Moderno. Ainda no século XX, pelo menos até o fim da Guerra Fria, predominaram as autocracias, tanto de esquerda como de direita.

Despotismo, tirania e ditadura. Como já observado, esses são sinônimos imperfeitos de autocracia.

Despotismo qualifica um governo em que a relação entre governante e governados é igual à de senhor (despotes, em grego) e escravo. Tradicionalmente é utilizado em referência aos antigos impérios orientais. Geralmente se considera que os antigos déspotas governavam a título legítimo, pois esse tipo de dominação era aceito pelos povos dominados. Foi também utilizado pejorativamente em relação aos monarcas absolutistas do Estado Moderno, alguns deles sendo chamados de “déspotas esclarecidos” quando aceitavam influência do Iluminismo.
Tirania é o termo tradicional para qualificar o governo exercido por um líder ilegítimo e opressor.
Ditadura era o mecanismo da República romana utilizado em episódios de conturbação social ou perigo externo, quando os direitos dos cidadãos eram suspensos e um líder era escolhido para tomar as decisões necessárias para debelar a crise. Seu mandato era temporário e ele deveria responder pelos abusos que praticasse. Essa foi a origem de mecanismos constitucionais atuais para o enfrentamento de crises, como os estados de sítio, de emergência e de calamidade pública. Em 48 a.C., Julio César, aproveitando-se da guerra civil e de seu poder militar, se fez ditador de Roma, porém sem prazo determinado, sendo assassinado em 44 a.C por senadores que defendiam a república e queriam impedi-lo de restaurar a monarquia em Roma. A partir daí, ditadura passou a designar um governo forte, com poder concentrado e apto a tomar medidas excepcionais, como foi o Comitê de Salvação Pública instalado pelos jacobinos durante fase do terror da Revolução Francesa (1793). No século XX, tornaram-se comuns as ditaduras militares, sob o pretexto de evitar revoluções socialistas.

Autoritarismo. Como visto, autocracia abrange todos os regimes caracterizados pelo autoritarismo. Segundo Loewenstein o autoritarismo moderno se caracteriza pelo monopólio do poder por uma pessoa ou grupo de pessoas, excluindo a participação dos destinatários do poder na formação da vontade estatal. Há um predomínio do Poder Executivo sobre os demais Poderes, que funcionam sob uma aparência de normalidade. Esse tipo de regime normalmente não procura impor sua ideologia ao povo, contentando-se com o controle político. Não é incompatível com o Estado de Direito, possuindo, em regra, uma Constituição, porém os direitos individuais não são adequadamente garantidos. Exemplos desse tipo de regime são as ditaduras militares latino-americanas da década de 1970 e o chamado “neopresidencialismo”. Entre os regimes autoritários, há os totalitários, que além do autoritarismo possuem outras características específicas.

Totalitarismo. Termo criado por Mussolini, também autor da frase “tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado”. Segundo Loewenstein, além do controle político, o totalitarismo pretende abranger toda a ordem socioeconômica e moral do Estado, modelando a vida privada, a consciência e os costumes do povo segundo uma ideologia oficial imposta a todos. São instrumentos desse tipo de regime a polícia política, o partido único, o monopólio dos meios de comunicação de massa, a propaganda, o culto à personalidade de um líder carismático e o terror contra os adversários. Foi muito bem retratado no romance 1984, de George Orwell.

Formas de Totalitarismo. Numa época em que o socialismo ainda tinha muito prestígio entre os intelectuais, Hannah Arendt, em sua obra Origens do Totalitarismo (1950), abrangeu no conceito de totalitarismo tanto o nazi-fascismo como o socialismo praticado na URSS, sendo muito criticada por isso. Atualmente, é praticamente consensual que esses regimes de fato eram totalitários. Um tipo novo de totalitarismo identificado por alguns autores é o praticado em teocracias islâmicas, como o Irã.

Fascismo. O nome fascismo vem do italiano fascio (feixe), lembrando o termo latino fasces, feixe de varas com um machado no meio, que simbolizava a autoridade dos magistrados e a unidade do povo na Roma antiga. O movimento foi criado na Itália por Mussolini no início do século XX e se espalhou por diversos países, inclusive o Brasil (Integralismo). É xenófobo e procura integrar a nação num todo orgânico, anulando as individualidades. Segundo Bobbio, trata-se de um sistema autoritário de dominação com as seguintes características:
a) monopólio do poder por um partido único de massa, hierarquicamente organizado;
b) ideologia fundada no culto do chefe, na exaltação da coletividade nacional, no desprezo dos valores do individualismo liberal e no ideal da colaboração de classes, em oposição ao socialismo, num sistema de tipo corporativo;
c) objetivos de expansão imperialista;
d) mobilização das massas e seu enquadramento em corporações (sindicatos etc.) associadas ao regime;
e) aniquilamento das oposições mediante o uso da violência e do terror;
f) aparelho de propaganda baseado no controle dos meios de comunicação de massa;
g) crescente dirigismo estatal no âmbito de uma economia que continua a ser, fundamentalmente, de tipo privado;
h) tentativa de integrar nas estruturas de controle do Estado a totalidade das relações econômicas, sociais, políticas e culturais.

Nazismo. Abreviação de “nacional-socialismo”, ideologia do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP), liderado por Adolf Hitler a partir de 1921 e que chegou ao poder na Alemanha em 1933. Incorporou e exacerbou as características do fascismo italiano. Era socialista no sentido de que pretendia massificar as políticas sociais do Estado, porém em benefício apenas da própria nação, abominando o internacionalismo marxista. Também desprezava o igualitarismo socialista, pregando o chamado “darwinismo social”. O componente nacionalista foi exacerbado pelo ideal de supremacia ariana e pelo ódio racial, dirigido especialmente contra os judeus, assassinados aos milhões.


"Aprendi muito com o marxismo. Não com essas doutrinações sociais, essas asneiras absurdas – mas, sim, com seus métodos" (Adolf Hitler, "in" Joachim Fest, "Hitler", vol. I, ed. Nova Fronteira).

Socialismo. O socialismo implantado em diversos países a partir da Revolução Russa de 1917 baseava-se nas teorias de Marx e Lênin. Segundo Marx, as contradições do sistema capitalista causariam fatalmente a sua destruição, porém, para acelerar o processo, era necessário que a classe trabalhadora (proletariado) tomasse o poder pela revolução. A partir daí, o Estado, comandado pela “ditadura do proletariado”, tomaria o controle da propriedade privada e dos meios de produção e acabaria com a divisão da sociedade em classes. Vendo suas teorias sociais e políticas como “verdades científicas”, os seguidores de Marx não toleravam opiniões contrárias. Para Lênin, a ditadura seria comandada pelo partido (“vanguarda do proletariado”) e os opositores deveriam ser simplesmente exterminados. Esse primeiro momento seria o socialismo. Num segundo momento, a propriedade privada seria extinta e o próprio Estado, tornando-se desnecessário, desaparecia, implantando-se o comunismo. O estágio do comunismo nunca chegou a ser atingido, implantando-se, na realidade, Estados de tipo totalitário, comandados por uma minoria que não queria abdicar do poder. Assim, tanto na URSS como em seus satélites da chamada “Cortina de Ferro” (Alemanha Oriental, Albânia etc.) e ainda hoje na China, na Coreia do Norte e em Cuba, houve a implantação de regimes autoritários de partido único, com culto à personalidade do líder, perseguição de opositores pela polícia política e outros componentes tipicamente totalitários. Calcula-se que esses regimes assassinaram mais de 50 milhões de pessoas, superando os regimes nazi-fascistas.

Para pensar

“Comunistas defendem classe, nazistas defendem raça, fascistas defendem a nação. Todas essas ideologias – podemos chamá-las de totalitárias – atraem os mesmos tipos de pessoas” (Jonah Goldberg, Fascismo de Esquerda, p. 88.)



Bibliografia
Leitura essencial:


DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 75 a 78.
LOEWNSTEIN, Karl. Teoría de la Constitución, 1ª parte, cap. 3.

Leituras complementares:
ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo.
BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política.
________. O futuro da democracia – uma defesa das regras do jogo.
________. A teoria das formas de governo.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A democracia possível.
FINLEY, M. Y. Democracia antiga e moderna.
GOLDBERG, Jonah. Fascismo de Esquerda.
ORWELL, George. 1984.
RIBEIRO. Renato Janine. A democracia (Coleção Folha Explica).
1984, de George Orwell.
WEFFORT, Francisco (org.), Os clássicos da política, vol. 2, capítulo sobre Tocqueville.

Filme: A Onda (Die Welle). Alemanha, 2008. Direção e roteiro: Dennis Gansel (obrigatório, vai cair na prova).