sábado, 17 de setembro de 2011

Resumo 23 - Separação de Poderes


IV – Estado e Governo

6. Separação de Poderes



“Todo o poder corrompe: o poder absoluto corrompe absolutamente” (Lord Acton, 1887).


Introdução. Como já visto, o poder do Estado é uno, pois a soberania é indivisível. Esse poder, porém, pode ser concentrado ou distribuído por vários órgãos do Estado. Além disso, os estudiosos da política há muito tempo distinguiram três formas básicas pelas quais o poder do Estado se manifesta: a elaboração das leis, a execução das leis e o julgamento dos conflitos interpretando e aplicando as leis.

Poderes do Estado. O poder do Estado, portanto, atua de três modos básicos:
Legislação é a elaboração da lei (norma geral, abstrata e dotada de sanção).
Administração é a execução ou aplicação da lei por dever de ofício, sem necessidade de provocação.
Jurisdição é a aplicação da lei, de forma definitiva, nos conflitos de interesses, mediante a provocação de uma das partes.

Por exemplo: um imposto é sempre criado por uma lei (legislação); criado o imposto, o Estado vai cobrá-lo das pessoas (execução ou aplicação da lei no caso concreto); caso haja litígio entre o Estado e o contribuinte, essa lide será decidida por um órgão do Estado, que interpretará a lei e dirá quem tem razão (jurisdição).

“Separação de poderes”. A identificação dessas três formas básicas de atuação do Estado e, posteriormente, a utilização dessa distinção para a moderação do poder e garantia da liberdade deu origem à teoria chamada de “separação de poderes”. Note-se que essa teoria não visa dividir o poder, mas sim distribuir as diferentes funções para órgãos distintos do Estado.

Antecedentes históricos. Aristóteles (século IV a.C.) foi o pioneiro na identificação das três funções básicas do Estado, recomendando que fossem distribuídas em mãos diferentes para a boa organização da polis. Marsílio de Pádua (século XIV) afirmou que legislador deve ser o povo e não o monarca. Maquiavel (século XVI), afirmou a conveniência de o Príncipe ter juízes independentes. Segundo Locke (século XVIII), os poderes do Estado seriam quatro: Legislativo, Judiciário e o Executivo dividido em Prerrogativa (administração interna) e Poder Federativo (relações internacionais). Para ele, deveria haver supremacia do Legislativo, por este representar o povo.

Montesquieu. Charles-Louis de Secondat, barão de La Brède e de Montesquieu, foi um filósofo e jurista francês que viveu entre 1689 e 1755. Herdou o título de barão e o cargo de juiz do tribunal de Bodeaux de um tio, mas logo vendeu o cargo para se dedicar à filosofia. Levou mais de 20 anos para escrever sua obra máxima, O Espírito das Leis, publicado em 1748.

A teoria de Montesquieu. No Capítulo VI do Livro XI da obra, Montesquieu observa que existem três espécie de poder num Estado: o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Porém, segundo ele, “é uma experiência eterna que todo homem que tem poder é levado a dele abusar. Vai até encontrar limites”. Para Montesquieu, não há liberdade se um poder está unido ao outro, e onde esses três Poderes estão concentrados nas mãos de uma pessoa ou de um único órgão, reina um “despotismo atroz”. A fórmula para limitar o poder é a distribuição dos três poderes para órgãos diferentes, a fim de que um limite o outro, evitando assim o abuso e garantindo a liberdade. Segundo suas palavras, “para formar um Governo moderado, precisa combinar os poderes, regrá-los, temperá-los, fazê-los agir; dar a um poder, por assim dizer, um lastro, para pô-lo em condições de resistir ao outro”.

Freios e contrapesos. Para Montesquieu, os poderes devem ser independentes e harmônicos, não devendo haver supremacia de um sobre outro. Assim, além da separação dos poderes ele aconselha que haja controles recíprocos, com um poder interferindo em alguns pontos no funcionamento do outro. Por exemplo, o Executivo poderia convocar o Legislativo e vetar leis aprovadas por este, consideradas inconvenientes. O Legislativo, por sua vez, poderia fiscalizar a execução das leis, exigindo que o Executivo preste contas. Posteriormente, essa teoria, que ficou conhecida como freios e contrapesos ou checks and balances, foi desenvolvida nos EUA a partir de 1787, onde foram implantados outros mecanismos, como controle de constitucionalidade e de legalidade pelo Judiciário, o impeachment do chefe do Executivo pelo Legislativo, a nomeação dos membros dos tribunais superiores pelo chefe do Executivo, etc.

Funções típicas e atípicas. Além dos freios e contrapesos, cada um dos três poderes tem funções típicas e atípicas, a fim de que possam funcionar adequadamente, mantendo a independência e a harmonia. O Legislativo tem como função típica a legislação e como funções atípicas a administração (funcionários próprios, material etc.) e jurisdição (julgamento do impeachment, julgamento disciplinar de seus membros). O Poder Executivo tem como função típica a administração e como funções atípicas a legislação (medidas provisórias, decretos, veto, iniciativa de lei) e jurisdição (processo administrativo). O Poder Judiciário tem como função típica a jurisdição e como funções atípicas a administração (funcionários próprios, material etc.) e legislação (iniciativa de lei).

Dogma do Constitucionalismo liberal. A partir das Constituições dos EUA (1787) e da França (1791), a teoria da separação dos poderes, com o fim de limitar o poder e assim garantir a liberdade, tornou-se um dogma do Constitucionalismo Liberal e foi incorporada na maioria das Constituições. Já no século XX, porém, ela passou a sofrer críticas, principalmente porque prejudicaria a eficiência do Estado. Atualmente, muitos autores afirmam que o dogma da separação de poderes estaria superado.

Função de controle. O eminente constitucionalista alemão Karl Loewenstein sustenta a existência de um Poder de Controle, que seria exercido pelo Ministério Público e pelo Legislativo, que tradicionalmente exerce a fiscalização do cumprimento das leis pelo Executivo, inclusive através do Tribunal de Contas. Podemos acrescentar que nesse contexto estaria também o controle externo do Judiciário e do Ministério Público e a imprensa livre, essencial para o controle do poder na democracia.

Para pensar. Você acha que o dogma liberal da separação de poderes está superado?

Bibliografia

Leitura essencial:
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo IV, itens 115 a 120.

Leituras complementares:
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política, Cap. 10.
MONTESQUIEU, Charles de. O espírito das leis, Livro XI, Cap. VI.
WEFFORT, Francisco (org.), Os clássicos da política, vol. 1, capítulo sobre Montesquieu.

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