segunda-feira, 15 de março de 2010

Resumo 7 - O Estado: origem e formação

II – Do Estado

1 – Origem e formação do Estado.


“Ninguém nunca viu o Estado. Quem poderia negar que ele seja uma realidade? O lugar que ele ocupa em nossa vida cotidiana é tamanho que não poderia ser retirado dela sem que, ao mesmo tempo, ficassem comprometidas nossas possibilidades de viver” (Burdeau)

Introdução. Atualmente, todos os seres humanos vivem num Estado ou, pelo menos, sob a autoridade de um Estado. O Estado é a sociedade mais importante e mais poderosa no mundo atual. Mas o que é o Estado? Quando surgiu? Por que ele existe? Qual o seu futuro?


Denominação. O que hoje chamamos de Estado já foi chamado pelos gregos de pólis e pelos romanos de civitas. Já foi chamado também de república e império. Hoje, na linguagem informal, é chamado de país (do latim pagos e do italiano paese = lugar geograficamente delimitado e habitado por uma comunidade)

Estado. O primeiro teórico a utilizar a palavra Estado para denominar uma sociedade política foi Maquiavel, na obra O Príncipe, de 1513. A palavra vem do latim status, que significa “estar firme”, sendo coerente com o anseio de Maquiavel de que a Itália da época, dividida em vários pequenos reinos e repúblicas, muitas vezes em guerra entre si, se unificasse sob um poder soberano e obtivesse estabilidade social e política.

Estado ou estado? Recentemente, a revista Veja anunciou que passaria a grafar a palavra “estado” com inicial minúscula, a fim de marcar sua posição pela mínima intervenção do governo na economia e na sociedade (liberalismo). Lembrou que os países de língua inglesa, onde essa idéia prevalece, a palavra é grifada com minúscula. Já onde há uma interferência maior do governo na sociedade e na economia, como no Brasil e na França, a palavra é grafada com maiúscula.

Quando surgiu o Estado? Há, basicamente, três teorias sobre a época de surgimento do Estado:

a) O Estado, assim como a sociedade, existe desde que o ser humano surgiu na Terra

b) O Estado é produto da evolução natural da sociedade humana e foi precedido por outros tipos de sociedades, como tribos, clãs etc.

c) O Estado surgiu somente quando adquiriu características bem definidas, principalmente a idéia de soberania (poder máximo e exclusivo sobre um determinado território habitado por um povo), que só aparece no Estado Moderno. Alguns autores chegam a afirmar que a data do surgimento do Estado foi a Paz de Westfália, em 1648.

Paz de Westfália. Independente de ser ou não o marco do surgimento do Estado Moderno, a Paz de Westfália (1648) foi um marco importante na história da política, porque, pondo fim à Guerra dos 30 anos, resultou no reconhecimento das fronteiras geográficas dos Estados europeus, dentro das quais estes poderiam exercer o poder de forma soberana, excluindo o poder do imperador e do papa e unificando a nação.

Justificação. Tentando justificar a formação original de Estados, há duas teorias:
a) formação natural ou espontânea: o Estado se forma naturalmente, por evolução de outras formas de sociedade

b) formação contratual: o Estado se forma por um ato de vontade, a partir de uma decisão racional (contratualismo)

Causas determinantes da formação de Estados. Estudando as causas que deram origem ao Estado, há as seguintes teorias:

a) Origem familial ou patriarcal: desde Adão e Eva, cada Estado surgiu a partir de uma família, chefiada por um patriarca (teoria sustentada por Filmer para justificar o absolutismo e que foi refutada por Locke no Primeiro Tratado sobre o Governo)

b) Atos de força e dominação. Segundo autores como Oppenheimer, os Estados se formaram a partir da dominação de um grupo sobre outro, sendo criados para regular as relações entre vencedores e vencidos

c) Fatores econômicos ou patrimoniais. Teóricos como Platão e Marx & Engels sustentam que o Estado surgiu por motivos econômicos ou patrimoniais. Platão afirma que o Estado deriva da necessidade de cooperação e divisão do trabalho entre as pessoas. Marx e Engels sustentam que o Estado surgiu com a evolução da sociedade, a partir do estabelecimento da propriedade privada, como um instrumento para a dominação de proprietários sobre não-proprietários. Segundo eles, o Estado está fadado a desaparecer quando for eliminado esse tipo de relação.

Engels. Em sua obra A origem da família, da propriedade privada e do Estado, Engels, baseado nos estudos antropológicos de Morgan, expõe a sua visão materialista da história, segundo a qual os meios de produção determinam a organização social. Morgan divide a evolução social da humanidade em três grandes estágios: Selvagem, Barbárie e Civilização, cada um deles subdividido em três fases: inferior, média e superior. Todos os povos passam por esses estágios em diferentes épocas da história.

Estágios da civilização. a) Selvagem: inferior (parcialmente nas árvores), médio (fogo, linguagem, instrumentos de pedra), superior (arco e flecha, aldeias). b) Barbárie: inferior (cerâmica, criação de animais, cultivo de plantas), média (irrigação, criação de gado, construções de pedra e tijolo), superior (escrita, arado de ferro). c) Civilização: inferior (cidades, artes), média (indústria), superior (não atingida).

Evolução da família. Segundo Engels, no estágio selvagem, prevalecia a promiscuidade sexual no interior das tribos. A partir da barbárie inferior, as tribos começam a ser divididas em gens (grandes famílias), segundo a linhagem feminina (matriarcado), com proibição do casamento endogâmico (no interior das gens). A seleção natural privilegiou esses grupos. Nesse estágio a mulher desempenhava papel preponderante, não havia divisão de classes sociais e a propriedade dos meios de produção era comum.

Surgimento do Estado. Na fase média da barbárie, com a criação de animais e a agricultura, surge a noção de propriedade privada dos meios de produção, o homem passa a preponderar e a exigir fidelidade da mulher para garantir a herança de sua prole (patriarcado). O Estado surge para legitimar essa nova realidade e garantir a divisão da sociedade em classes. Segundo Engels, as contradições desse sistema levarão à sua destruição, com o conseqüente desaparecimento do Estado.

d) Formação do Estado pelo desenvolvimento natural da sociedade: O Estado se forma naturalmente, pela evolução natural da sociedade, independentemente de fatores externos e sem preponderância de um fator (Lowie). É a teoria mais aceita atualmente.

Modos de formação. A doutrina distingue os seguintes modos de formação dos Estados:

a) modo originário: quando um Estado surge onde antes não havia Estado nenhum (casos estudados acima, não existem exemplos atuais)

b) modo derivado: quando novos Estados surgem a partir de Estado ou Estados pré-existentes. O modo derivado pode ocorrer por fracionamento (ex.: antigas colônias que se tornaram independentes; Rep. Tcheca e Eslováquia) ou por união (ex.: EUA)

c) modo atípico: formação artificial, imprevisível, por tratado ou por imposição de outras potências (ex.: Vaticano, as duas Alemanhas, Israel)

Momento do nascimento. Não há uma regra definida para garantir que um novo Estado foi criado. Basicamente, é necessário que haja viabilidade interna (estabilidade social, política e jurídica) e reconhecimento pelos demais Estados. Normalmente, quando esses dois fatores ocorrem, o novo Estado é aceito na ONU, mas isso não é condição essencial para a existência de um Estado.

O caso do Kosovo. O Kosovo é um território habitado por albaneses étnicos que fazia parte da Federação Iugoslava e foi palco de uma guerra civil nos anos 90, quando foi atacado pelo governo iugoslavo e defendido pela OTAN. Após negociações fracassadas, declarou unilateralmente a independência, sendo reconhecido como Estado por EUA e França, mas não pela Rússia e pela Espanha, e ainda não obteve ingresso na ONU. Suas instituições governamentais ainda são precárias. Por isso, ainda não pode ser considerado como um Estado consolidado.

Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo II, itens 23 a 27.

Leituras complementares: F. Engels, A origem da família, da propriedade privada e do Estado, caps. I a IV. Martin van Creveld, Ascensão e declínio do Estado, Cap. 1.

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