terça-feira, 1 de março de 2011

Resumo 5 - Elementos da Sociedade - Poder

I – Da Sociedade (continuação)
2. Elementos característicos da Sociedade (continuação)
c) Poder


“Se procurarmos o que é permanente no poder enquanto passam as figuras que exercem seus atributos, vemos que ele não é tanto uma força exterior que viria pôr-se a serviço de uma idéia quanto a própria força dessa idéia” (Burdeau)


Introdução. O terceiro elemento característico da sociedade, depois da finalidade e das manifestações de conjunto ordenadas, é o poder. Trata-se de um dos conceitos mais importantes da Ciência Política e da Teoria do Estado. Max Weber define o poder como “toda probabilidade de impor a própria vontade numa relação social, mesmo contra resistências, seja qual for o fundamento dessa probabilidade”. Todas as sociedades são dotadas de poder, mas o poder do Estado é o mais importante, pois ele detém o monopólio do uso da força (coerção).

Características do poder. O poder é um fenômeno social, porque está presente em qualquer sociedade: família, escola, igreja, Estado etc. É também fenômeno bilateral, porque implica sempre uma vontade predominante e outra submetida. Pode ser analisado como relação (sujeitos) ou como processo (dinâmica, funcionamento). O poder é necessário? O que o justifica?

Anarquismo. “Anarquia” vem do grego e significa ausência de governo (arkê). As teorias anarquistas negam a necessidade e a legitimidade do poder. Há basicamente três linhas consideradas anarquistas: alguns movimentos filosóficos gregos, os cristãos primitivos e o movimento anarquista moderno.

Anarquistas gregos. Na Grécia antiga, os cínicos pregavam a vida de acordo com a natureza; os estóicos pregavam a igualdade e a fraternidade universal; os epicuristas pretendiam viver segundo o princípio do prazer. Nenhuma dessas correntes aceitava como legítimo o poder de um homem sobre outro.

O anarquismo cristão. Os primeiros cristãos não aceitavam a autoridade terrena, embora Jesus tivesse feito a distinção entre o que é de César e o que é de Deus. São Paulo pregava que todo poder vem de Deus, mas recomendava a submissão ao poder de Roma. Santo Agostinho, na Idade Média, escreveu “A Cidade de Deus”, em que o chefe seria o Cristo. Porém, o que prevaleceu no catolicismo foi a aceitação do poder temporal, seja aliando-se a ele, seja buscando o seu exercício pela própria Igreja.

O movimento anarquista. No século XIX surgem várias correntes anarquistas, a maioria delas influenciada pelo socialismo, que pretende extinguir o Estado por considerá-lo um instrumento da dominação dos ricos sobre os pobres.

O anarquismo de cátedra. Limitando-se à teoria, Léon Duguit afirma que o poder é um fato, baseado em crenças ou fatores materiais, mas é ilegítimo e desnecessário.

Anarquismo militante. Esse movimento pretendia colocar em prática seus objetivos, que eram a eliminação do Estado, da propriedade privada e da religião e a implantação de relações sociais livres, fundadas na solidariedade humana. Para Proudhon, “toda propriedade é um roubo”. Bakunin pregava a revolução por meios violentos e polemizou com Marx, por este aceitar a tomada do poder pela via eleitoral e uma fase de transição em que o Estado manteria o poder. Kropotkin preferia a via pacífica e sustentava que a cooperação é uma força mais importante para a evolução do que a competição. Os anarquistas praticaram atos terroristas no final do século XIX e início do século XX, e a partir disso o movimento foi perdendo força. No Brasil, imigrantes anarquistas italianos e espanhóis promoveram a greve geral de 1917.

“O governo da imensa maioria das massas populares se faz por uma minoria privilegiada. Esta minoria, porém, dizem os marxistas, compor-se-á de operários. Sim, com certeza, de antigos operários, mas que, tão logo se tornem governantes ou representantes do povo, cessarão de ser operários e por-se-ão a observar o mundo proletário de cima do Estado; não mais representarão o povo, mas a si mesmo e a suas pretensões de governá-lo. Quem duvida disso, não conhece a natureza humana” (Mikail Bakunin (1814 - 1876).

O poder necessário. A maioria dos teóricos entende que o poder sempre existiu e é necessário para manter a ordem e a coesão na sociedade, bem como para dirigi-la na busca das suas finalidades. Importa, assim, estudar o fundamento em que se baseia (origem, justificação) e verificar a sua legitimidade (aceitação social).

A busca de um fundamento para o poder.
Força. Nas sociedades primitivas, o poder era baseado exclusivamente na força (primeiro física, do guerreiro mais forte, depois econômica). Todavia, segundo Rousseau: “o mais forte nunca é suficientemente forte para ser sempre o senhor, senão transformando sua força em direito e a obediência em dever”.

Divindade. Já na antiguidade, passou-se a fundamentar o poder na divindade, surgindo os impérios teocráticos (Egito, Babilônia etc.). O mesmo ocorreu no início do Estado Moderno, com as monarquias absolutistas, que sustentavam o direito divino dos reis ao poder.

Povo. Desde a Idade Média, há uma linha de pensamento, que tomou força com o Estado Moderno, que considera povo como titular do poder. Dessa linha resultaram o contratualismo e democracia, em que a vontade do povo (vontade geral) é o fundamento do poder.

Poder x Direito. A partir do século XIX, com a consciência de que o poder usa a força, mas não se confunde com ela, surge a aspiração de fazer coincidir o poder (fenômeno de fato, político) com o direito (regras e limites para o exercício do poder). Alguns procuraram basear o poder exclusivamente na lei (Estado de Direito).

Culturalismo Realista. Segundo Miguel Reale, porém, poder e direito não se confundem, mas são fenômenos concomitantes, que sempre coexistiram nas sociedades (ubi societas, ibi jus; ubi jus ibi societas). O que varia é apenas o grau de juridicidade, conforme o estágio de evolução cultural de cada sociedade (Culturalismo). Assim, se numa sociedade primitiva prevalece a força, esta sempre é exercida segundo uma regra, mesmo que seja aquela imposta pelo mais forte. Já nas sociedades mais evoluídas, o poder é quase que inteiramente exercido conforme as regras jurídicas.

Legitimidade do Poder. Considerando que poder e direito não se confundem, a legitimidade do poder também não coincide necessariamente com a legalidade. Pode haver governos legais, mas ilegítimos (ex.: o Egito durante a ditadura de Mubarak) e governos legítimos, mas ilegais (ex.: o Egito depois da queda da ditadura, enquanto houver apoio popular).

Max Weber (1864-1920). Em estudo que se tornou clássico, o sociólogo e cientista político alemão Max Weber considera que existem três formas de poder legítimo:
Tradicional: próprio das monarquias, independe da lei formal (ex.: as antigas monarquias europeias)
Carismático: baseado nas qualidades excepcionais do líder (carisma), que procura ligação direta com o povo, muitas vezes contra a lei (ex.: Hitler, o populismo latino-americano, Lula)
Racional ou burocrático: autoridade impessoal, derivada da lei, única forma em que poder e direito necessariamente coincidem (ex.: as modernas democracias liberais)

Importante notar que essas três formas ideais de poder legítimo dificilmente se encontram isoladas, sendo mais comum que se apresentem de forma combinada.

Georges Burdeau (1905-1988). Segundo Burdeau o que legitima o poder é a sua atuação. Poder legítimo é o poder consentido, aceito pela comunidade, porque encarna a força da idéia de bem comum.

Despersonalização e racionalização do poder. Busca-se, atualmente, a objetivação (despersonalização) e a racionalização do poder (governo baseado na lei, fruto da vontade popular e não da vontade do governante).


Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Capítulo I, itens 11 a 20.
Leituras complementares: Miguel Reale, Teoria do Direito e do Estado, Cap. IV, item 92. Georges Burdeau, O Estado, Cap. I. Reinaldo Dias, Ciência Política, Cap. 2. Max Weber, “A política como vocação”, in Ciência e política – duas vocações.

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